pelo espírito Eugênia.
A história da donzela que, encastelada em torre-prisão, se utiliza dos próprios cabelos, a fim de, com eles, crescidos ao infinito e entrelaçados em tranças gigantescas, permitir a subida de seu amado-salvador, é um pouco a história de todos nós, que, aprisionando-nos na torre de idéias absurdas, ilusões, medos e dúvidas, não nos deixamos visitar pelo Eu Superior. O ego, nesta fábula, é representado por Rapunzel, passiva e triste, que, todavia, mantém o ideal persistente de tecer longas tranças, para que seu libertador se aproxime. Numa situação aparentemente desesperadora, em que muitos desistiriam completamente de lutar, ela persiste, impertérrita, na espera do seu amado, mas uma espera laboriosa, mesmo que em labor aparentemente sem qualquer poder para resolver seu problema, pois que, no final da história, constituirá este o meio pelo qual tudo se solucionará.
Você, prezado amigo, cara amiga, deve se abrir a essa luminosa possibilidade. Por se sentir encarapitado(a) em uma torre de aparente impossibilidade de realizar seus ideais, sua meta maior e mais elevada de vida, não deduza daí que deva desistir de tudo. Continue tecendo, fio a fio, suas tranças de segurança e busca, até que chegue o tempo em que as longas madeixas de sua alma alcancem o poço fundo de seu inconsciente, d’onde extraia a vitalidade perdida, a força malévola – invertida – da sombra psicológica, seu lado obscuro, trevoso, inferior, que precisa ser drenado, processado, elaborado, reincorporado à sua consciência. Curioso notar que é de “baixo” que o salvador vem, e não de “cima”. Quem está em cima é ela (o eu racional, de vigília) – de cima do poder decisório, de decidir pela sua derrota ou pela perseverança imorredoura. Ainda quanto a vir de “baixo” a Luz: de fato, conforme grandes místicos o disseram no passado e afirmam no presente, somente por meio da travessia da escuridão se pode chegar à luz. Tão-só mediante a integração do lado menos desejável do Si é que se chega à excelência d’Ele. O subconsciente e a superconsciência estão muito próximos. É através do equilíbrio das funções instintuais que mais clara e segura fica a intuição: esta como aquelas estão imersas no oceano sem fundo da inconsciência.
Observe-se, em particular, a metáfora de Rapunzel precisar esperar que os cabelos crescessem a pouco e pouco. Ninguém realiza grandes feitos de um assalto. Somente com grande determinação, a pessoa pode suportar o adiamento indefinido das gratificações esperadas, de olho na meta que luze à distância.
Teça, estimado(a) leitor(a), tranças de persistência, paciência, trabalho continuado, estudo de si próprio(a), e, sobremaneira, de grande dedicação aos seus sonhos mais subidos. Não que deva realizar fantasias megalomaníacas ou desejos bizarros, mas que persiga as sugestões mais sutis e profundas de paz que lhe advêm do fundo do coração. Nelas, encontrará a verdade, a sua verdade pessoal. Nelas, descobrirá o caminho sinuoso e estreito, mas certeiro, que o(a) conduzirá à realização e à ventura. Não interessa a altura de sua torre de dificuldades e a dimensão das adversidades que o(a) cercam. Simplesmente, aceite o seu chamado para que, quando seu príncipe (princesa) chegar – a oportunidade de superação do atual padrão de consciência, para a solução de todas as pendências e o adentramento em um nível maior de satisfação e segurança –, ele (ela) o(a) encontre preparado(a), com as tranças feitas, de molde a lhe propiciar entrada no reduto de sua alma e tudo metamorfosear.
Lembra-nos, esta fábula, a passagem evangélica das dez virgens loucas, em confronto com as dez virgens prudentes. Enquanto estas guardavam o seu óleo, para a chegada do noivo sagrado, as virgens loucas desperdiçavam-no, irrefletidamente, até que o nubente, ao aparecer, na calada da noite (chega quando menos se espera a hora da transformação e das grandes oportunidades existenciais de realização), encontrou-as totalmente desprovidas do elemento indispensável às núpcias.
Não perca tempo em circunvoluções desnecessárias. Pare, pense e concentre-se no essencial, um pouco todos os dias, mas sempre. Agindo assim, com tenacidade e denodo, em vez de se desesperar, rebelar-se ou apenas se enfastiar com o serviço tedioso mas necessário de todos os dias, você será premiado(a), quando menos esperar, com o ensejo divino de fazer e se tornar aquilo que deve, aquilo a que se sente propelido(a), aquilo a que veio à Terra, logrando a plenitude de sua felicidade e paz. Lembre-se de Rapunzel e das virgens prudentes; não seja como a bruxa rabugenta que desiste de esperar o príncipe, nem como as displicentes e irresponsáveis virgens loucas, que se esqueceram do que esperavam, desviando-se para frivolidades perigosas e destrutivas. Tenha sempre em mente que existe um propósito para tudo, mas que é você, como ser consciente, quem deve descobrir, imprimir e acrisolar o significado de sua existência, fazendo valer a finalidade divina do serviço que o(a) trouxe ao mundo físico, para bem geral e para sua própria ventura.
(Texto recebido em 8 de outubro de 2000. Revisão de Delano Mothé.)