Benjamin Teixeira
pelo espírito Eugênia.
“O anjo disse-lhes: ‘Não temais. Eis que vos anuncio uma boa nova, que será alegria para todo o povo: hoje nasceu, na cidade de Davi, um Salvador, que é o Cristo Senhor. Isto vos servirá de sinal: achareis um recém-nascido envolto em faixas e posto numa manjedoura’. E, subitamente, ao anjo se juntou uma multidão do exército celeste, que louvava a Deus e dizia: ‘Glória a Deus, no mais Alto dos Céus; e, na Terra, paz aos homens, objetos da benevolência divina’.”
(Evangelho de Lucas, 2:10-14)
Quando Nosso Senhor Jesus aportou à Terra, encontrou um planeta primitivo, em que as noções de Direito ainda engatinhavam, na Roma dos Césares; onde a filosofia havia tido seus primeiros albores verdadeiros há poucos séculos, na Grécia Antiga da acrópole ateniense; e em que as mais significativas realizações do Espírito haviam sido esboçadas, como mera possibilidade, nos seus primeiros bruxuleios de teoria espiritual, poucos séculos antes também, nas místicas Índia e China das figuras históricas de Buda, Lao Tsé e Confúcio, quanto do vulto mitológico de Krishna.
Após Ele, o renascimento do Espírito eclodiu, todos os dias, em todos os âmbitos da ação e do saber humanos, em deflagrações epopéicas de guerra entre nações, em digladiações ferrenhas de conflitos de interesses, idéias e valores, entre povos, comunidades e no solo ingrato dos corações humanos, carecentes, do primeiro ao último nível de consideração, de toda ordem de socorro do Céu. Hospitais, orfanatos, escolas para crianças e adultos, asilos para idosos, leprosários, sanatórios para loucos e devassos, casas de caridade de todas as procedências e naturezas, espocaram em toda parte, século sobre século, até dois milênios dobrarem-se sobre si… O mundo nunca mais foi o mesmo… e, a longo prazo, a Terra foi salva do Armagedon.
Ninguém perfará idéia do que significou, em toda sua completude de implicações, a descida, aos proscênios carnais, da amantíssima figura de Jesus Cristo. Gênio incomparável da filosofia, ao fazer alusão à verdade como algo que se percebe nas conseqüências e desdobramentos de alguma coisa, evento ou pessoa, mais que em sua essência, indevassável em primeiro exame – “Conhece-se a árvore pelos frutos” –, foi pragmático e estonteante em suas proposições lógicas e objetivas, como quando vituperou, severo, na indagação inesquecível: “Néscios, por acaso estais tardos em inteligência?” Terno e amoroso como uma mãe infinitamente dadivosa, na passagem do pastor que sai em busca da ovelha perdida entre 99, que são quase relegadas a desamparo enquanto dura sua procura, na calada da madrugada, foi, outrossim, enérgico como um marechal em campo de batalha, chicote estalando com o pulso firme de seu braço forte, ao espantar mercadores de interesses mundanos do templo das considerações divinas.
Jesus é o referencial absoluto, para os parâmetros terrenos, do ser humano completo, ativo e dócil ao mesmo tempo; acolhedor e interventor, simultaneamente; senhor e servo num mesmo gesto. Que aprendamos com Ele, neste Natal que se repete, ano a ano, para que reflitamos, reiteradas vezes, a arte de nos construir a nós mesmos, conforme tanto pediu Ele fizéssemos, abandonando o homem velho que somos (ou a mulher velha), para nos tornar o homem novo (a mulher nova) em que devemos nos transformar.
Não por acaso temos o espaço de uma semana, nas tradições cristãs do Ocidente, entre o Natal e o réveillon. A Espiritualidade Sublime quis, no aproveitamento das festividades pagãs do solstício de inverno, convertidas em celebração do nascimento de Jesus, remeter-nos à circunspeção das meditações justas e profundas, no sentido de nos preparar para um novo ciclo, representado, metaforicamente, na convenção do término de um ano e início de outro. Que aproveitemos, assim, esta psicosfera planetária de festejo, expectativa e criatividade, para fermentar a gleba de nossas psiques, com esta semente promissora de eternidade que o Cristo constitui, de molde a que possamos, um dia, dizer, a respeito de nossos próprios corações: “Aleluia! Aleluia! O Cristo nasceu no tabernáculo de nossas almas!” E, se nos falta, como a quase todos nós, um berço íntimo suntuoso, a fim de permitir o aporte de ser tão divino quanto o Cristo Cósmico em que todos nos transfundiremos, um dia, pelos indefectíveis mecanismos da evolução, recordemo-nos de que o Mestre dos mestres, para se fazer presente, na ribalta do mundo terreno, surgiu, em vagidos delicados e em frágil compleição de um bebê, em pleno calor tépido e paupérrimo de uma simples manjedoura, entre gado, feno e odores fétidos das fezes de animais, uma boa alegoria, creio eu, do que hoje é o coração humano, cheio de podridão, primitivismo e pobreza, mas que pode, com o amor santo de uma Mãe Divina, como Nossa Amantíssima Mãe, Maria de Nazaré, converter-se no mais puro sacrário da Terra, onde a Luz imarcescível do Criador possa brilhar… eternamente…
(Texto recebido em 23 de dezembro de 2008. Revisão de Delano Mothé.)