(Na celebração dos vinte anos do Instituto Salto Quântico)
por Benjamin Teixeira.
Era Carnaval de 1988. Eu contava recém-completados 17 anos, e ainda brincava entre os foliões (fi-lo por quatro anos, desde que, aos 13 de idade, meu pai me autorizou a participar da folia coletiva), nas festas fechadas do Iate Clube de Aracaju. O refrão “Maluquete, do que você é tiete? Eu sou… sou tiete do chiclete…” ainda era tocado, obrigatoriamente, em todos os dias de “farra”. Se você tem mais de 30 anos, provavelmente acabou de fazer um sorrisinho em silêncio, atiçado por uma doce e divertida nostalgia. Pois é… o tempo voa…
Vinte anos (a serem completados no próximo dia 18 de fevereiro) de início das atividades do que hoje conhecemos como Instituto Salto Quântico, começo este marcado pela primeira vez que passei adiante, cheio daquele entusiasmo típico dos neófitos, a mensagem espírita, conduzindo à adesão ao Espiritismo minha querida irmã (confidente desde a infância) Marilia.
Algo curioso aconteceu-me nestes últimos dez dias, que me cabe aqui relatar, a pedido dos estimados orientadores espirituais. Para isso, contudo, devo relembrar (ou informar os que me conheçam menos) que a bondosa Eugênia é porta-voz de um conselho de veneráveis anciães sábios, “residentes” em freqüência consciencial ainda mais alta que a dela, na Espiritualidade Sublime. Comumente, por exemplo, a via, enquanto realizava o programa de televisão ou proferia palestras, ela mesma em transe, retransmitindo o que lhe vinha desta plêiade de gênios sublimados. O dirigente deste grupo excelso, volta e meia, no transcurso destas duas décadas, dignou-se a, misericordiosamente, fazer contato com minha muito limitada mente mediúnica, apresentando-se como Anacleto.
O mais antigo lampejo de comunicação psíquica que travei com ele ocorreu em novembro de 1989. Em meio ao debute de uma parenta, extremamente entediado com a conversação de uma roda de adolescentes em que estava inserido, senti-me “tragado para Cima”, desconectando-me provisoriamente do ambiente, sendo então notificado de que uma Elevada Inteligência do Plano Espiritual, de respeitabilíssima envergadura evolutiva, com nome de inicial “A”, estar-me-ia, no futuro, conduzindo em tarefas de cunho espiritual. A informação telepática veio-me tão clara e forte, que me entristeci, porque, inobstante anunciado que aquele Ser se comunicaria facilmente comigo em tempos vindouros, também sabia que era de todo impossível o intercâmbio habitual naquela época – estava despreparado para tanto. Em julho de 1994 (portanto, um qüinqüênio depois), este espírito psicografou pela primeira vez por meu intermédio, subscrevendo nessa oportunidade, dando-me a conhecer seu nome. Por aqueles dias, eu já trabalhava com Eugênia sistematicamente, há alguns anos. O texto foi, tão-somente, uma máxima:
“O tamanho da sua dor revela a dimensão da alegria que você está se negando.”
Simples, lacônico e profundo, concomitantemente, como os gênios costumam ser. Amiúde, procuramos causas complexas para nossos sofrimentos, esquecendo de vasculhar as finalidades, normalmente relacionadas a vocações e ideais negligenciados (que constituem nossa maior felicidade), cuja frustração costuma nos provocar crises.
Em 1997, Anacleto voltou a me aparecer, só que, então, passou a fazê-lo mais freqüentemente, até que, em 2001, tornou-se extremamente presente e atuante, nos preparativos para o lançamento do programa em rede nacional de televisão, pela Rede Brasil – TVE. Foi nesta ocasião, entre fenômenos fabulosos que ocorreram por aqueles meses, que me fez uma revelação bombástica (que partilhei com alguns poucos amigos – hoje, as raras testemunhas deste evento): no espaço de alguns meses, muito próximo de ser completado um ano de lançamento do programa na dimensão nacional (disse-me exatamente isso: “nas vizinhanças de se completar um ano de existência da exibição em rede”), Chico Xavier desencarnaria. De fato, 11 meses e um dia depois de eu falar, na manhã daquele 29 de julho de 2001, para todo Brasil, ao vivo, pelas dezenas de emissoras da TVE espalhadas pelo país, Chico Xavier deixaria, gloriosamente, este mundo físico, no início da noite de 30 de junho de 2002.
Anacleto, todavia, naquela época, trouxe-me uma notícia que me causou substancial transtorno emocional: estaria assumindo a condução da nossa Organização, de modo mais direto, através de comunicações mediúnicas por mim mesmo. Naquele tempo já profundamente ligado a Eugênia, entrei em parafuso. Sofri, então, por várias semanas, de mal-estar indescritível, ficando tão séria a situação, que começou a comprometer-me o desempenho no serviço mediúnico-espiritual, bem como o equilíbrio íntimo. O processo acabou por culminar com o retorno do sábio desencarnado ao estado de oclusão psíquica para mim.
Este mal-estar medonho que padeci, em lugar de alegria, com a chegada de um guia espiritual de estirpe evolutiva superior à da mentora que até então me orientava, pode soar bizarro para o leitor leigo, e mesmo para alguém de convicção espírita, mas que não conheça a experiência de viver, continuamente, dia sobre dia, mergulhado no campo mental de uma alma amorosa e santa como Eugênia (que foi, inclusive, minha mãe biológica por inúmeras existências físicas), e, de súbito, ver tudo isso esboroar. Para dar uma pálida idéia do que significaria psicologicamente, seria algumas vezes pior que a perda de um ente querido, porquanto a dúlcida mestra desencarnada compunha, comigo, já por aqueles dias, uma sinergia mental há muitos anos. Em resumo, para meu emocional, soava como se houvessem arrancado, sem anestesia, uma parte de mim, a melhor parte, aquela que era a orientadora, a amorosa, a sábia: minha mãe, minha amiga, minha mestra, meu ídolo. Ela não tinha propriamente desaparecido, mas assim o sentia, visto que, a cada dia, a adorável mentora surgia menos para mim, e Anacleto assumia mais a dianteira de todas as atividades. Este pandemônio interior em que me vi imerso, repentinamente, não era algo voluntário ou com que eu concordasse: simplesmente estava acontecendo comigo, e encontrava-me de todo impotente para solucionar a pendência. Era qual se me houvessem dito: “Parabéns, pelo alcance maior de seu trabalho. Como prêmio por sua dedicação e progresso, estamos providenciando a morte de sua mãe, para que você fique mais maduro e lúcido.” Com meu transtorno agravando gradualmente, o mestre do mundo espiritual retornou ao seu domínio de atuação “invisível”, e assim ficamos até a presente data. Primeiramente, foi rareando seus contatos, até que, no ano de 2002 (ao que me lembre), suspendeu, por completo, suas comunicações comigo.
Pois bem, agora retornemos ao presente, ao evento que fui orientado a narrar para os amigos leitores. Passados cinco anos das últimas falas de Anacleto, surgiu-me ele, como nunca o vi tão nitidamente, no meio de fabulosa explosão de Luz Branca, no fim da noite do dia 1º de fevereiro próximo passado. Espocou-me à psicovidência, com a aparência de homem esbelto e nobre, traços angulosos, pele ligeiramente amorenada (como típico dos italianos), cintilantes e profundos olhos azuis, entradas avançadas e cabelos nevados, sugerindo uns quase 70 anos de idade, em plena saúde e vigor. Com uma voz firme e máscula, mas aveludada – numa entonação de enternecimento paternal –, demonstrando uma invulgar lucidez e sabedoria a “saltar de todos os poros”, comunicou-me (pois é… a notícia do meu terror…) que estaria “assumindo, de modo mais direto, a condução das atividades desdobradas pelo prezado companheiro” – este mesmo que redige o presente relato.
Sim, de novo… o Salto Quântico assume proporções expressivas demais, volta a atingir muitos milhares de pessoas, por todo o país, com o programa sendo exibido em rede nacional de televisão, pelos mais de 100 canais da CNT, espalhados pelos rincões do Brasil, e, destarte, por conta do incremento exponencial no grau de responsabilidades e implicações graves, profundas, extensas e complexas de nosso trabalho, o chefe do clã espiritual de anciães sábios, que Eugênia representa, toma a frente na liderança espiritual da Organização.
Lembrei-me da crise de cinco anos atrás. Prometi a mim mesmo, então, empenhar-me por não atrapalhar o processo e exercitar a renúncia e a aceitação. O programa do dia seguinte havia sido excepcionalmente gravado (para fins de manutenção dos equipamentos da emissora local), de modo que, em casa, tornei a recebê-lo, em nova longa conversação esclarecedora, que – a pedido dele – não deveria ser registrada por escrito. Fui à palestra do dia seguinte ainda feliz e em paz. Mas o tempo ia se passando… e a “ficha foi caindo”. Eugênia, diferentemente do episódio de 2001, em vez de se fazer menos presente, paulatinamente, simplesmente sumiu, abruptamente. Conversava com ela diariamente, e, agora, a cada vez que evocava seu nome (por força até do hábito, para solicitar alguma orientação importante sobre a intrincada tarefa de conduzir almas a Deus, que me foi confiada), surgia-me, em seu lugar, de inopino, a imagem venerável de Anacleto, envolto em Luz, de tal modo surpreendente para mim, que diria me causar sustos, não fosse um ser tão amável e protetor. Não me agradava muito a troca de “personagens” atuantes no meu cenário íntimo; contudo, me esforcei por me sentir agradecido pelo cuidado e misericórdia do ínclito mestre, que eu, inclusive, sabia estar me atendendo apenas por conta da proporção avultada do trabalho espiritual, e não por merecimentos pessoais quaisquer que fossem. Assim, denodei-me por me mostrar invariavelmente satisfeito e respeitoso, nas interações com Anacleto. Apesar disso, eu tinha ciência de que poderia insistir para contactar Eugênia, com sucesso na operação, pois que eles respeitam o livre-arbítrio individual, mas era como se um Anjo me dissesse: “Olhe bem: não é que você esteja proibido de fazer ‘uma chamada para este número de seu celular', mas não é devido”. Claro que me senti na obrigação de obedecer. Como não atenderia a personalidades que sei serem espíritos de escol, autoridades do Domínio Sublime de Vida, representantes de Deus para nós?
No meio da semana, entretanto, a coisa foi ficando mais séria. Comecei a padecer de uma estranha sensação de perda de energia. Atribuía-a à ausência de comunicações com Eugênia, mas estranhava, já que Anacleto me esclarecera que permaneceria ativa minha sinergia com ela (porque indestrutível, fulcrada no amor puro que nos une); apenas, teria uma outra ponte ativa de conexão mental, com ele, numa interação complexa de psiquismos, semelhante, como lecionou o preclaro preceptor, ao que se dá com uma mãe que tem “fios mentais” de ligação afetiva com vários filhos, ao mesmo tempo. No meu caso, aconteceria o inverso da relação de “poder” da metáfora: eu era o filho das duas mentes avançadas que me honravam, com seu entrelaçamento psíquico comigo. Para me mitigar o sofrimento (hoje deduzo isso), Anacleto restringiu ao mínimo necessário suas comunicações, e enviou vários componentes da equipe espiritual de orientadores desencarnados do Salto Quântico, a travarem contato mais direto comigo: Roberto, Temístocles, Gustavo Henrique, Irmã Brígida – todos muito queridos amigos, com quem interajo mediunicamente, há muitos anos. Só que, para meu desconsolo, nada fazia deter a visível “descida vibratória” por que começara a enveredar, engolfando-me, irrefreavelmente, em amargura e desgosto com a vida. A uma certa altura não resisti, e perguntei a Irmã Brígida, na última quinta-feira, onde estaria Eugênia. “Está ocupada, em outras atividades” – foi a resposta um tanto evasiva e enigmática, sem adição de comentários. Fiquei arrasado. Nem a doçura de Irmã Brígida – que chamo, na intimidade, de “tia” Brígida (foi, de fato, minha tia-avó biológica, conquanto houvesse desencarnado seis anos antes de eu renascer) – compensava-me a falta de Eugênia. Para delinear uma noção do que se passara em meu coração, sentia como se houvesse perdido a mãe e estivesse sendo objeto das atenções de uma tia amorosa – ainda que se fique grato, não há como substituir-se a mãe, com a atenção da tia estimada.
“Mamãe morreu”, acabei por sentenciar para os íntimos – já estava em pandarecos emocionais, na sexta-feira. Passei o dia gelado (fisicamente mesmo): tenho um metabolismo intenso, que me faz muito quente e propenso a sentir muito calor quase o tempo inteiro. Na própria sexta-feira, trabalhei normalmente, estava operacional; no entanto, parecia que um dreno de energia me desvitalizava progressivamente. Até os braços e tórax estavam frios, para quem os tocasse – para perplexidade e preocupação dos que comigo convivem, embora partilhassem do mesmo luto psicológico que eu (só que todos sabiam o quanto deveria ser mais severa a dor em mim, em função da ruptura da sinergia mental com a adorada mentora espiritual). Uma insônia terrível me aturdiu, e passei a madrugada da sexta para o sábado angustiado, orando e meditando, para aplacar a consternação. Eram já 10h da manhã do sábado, não havia dormido direito ainda, desde a quinta-feira, e teria que estar ativo ao meio-dia, para os preparativos da exibição do programa ao vivo (às 15h30). Comecei a me sentir como se estivesse começando a enlouquecer, a mente se esvaindo, meu ser interno se “desmanchando”. Como a vigília de orações não surtira o efeito desejado, decidi-me por chamar o querido amigo Delano, a fim de que me ajudasse, fazendo preces comigo.
Iniciadas nossas orações a dois, Delano viu, mentalmente, um enorme buquê de flores espirituais (a Espiritualidade costuma trazer medicamentos e energias refazedoras e curativas em forma de flores). Uma explosão catártica aconteceu comigo: chorava e gemia como um moribundo, nos estertores finais das vascas da morte (pleonástico demais?). A vida estava escapando de mim: era uma sensação física, visceral. Eu estava me desconectando de mim mesmo… morrendo dentro do meu próprio núcleo de ser. No ápice do padecimento moral e psíquico, intraduzível em palavras, uma voz melodiosa e adorada me fez supor que o Céu se rasgara e despencava, retumbante, sobre a Terra:
– Meu filho!… por que tanta dor?… Tranqüilize-se! Sou eu, sua mãe, estou aqui, estarei sempre aqui…
Debulhando-me em lágrimas ainda mais copiosas, notei-me sendo impregnado por um brando torpor, que me “anestesiou” o corpo e a mente, fazendo-me, suavemente, mergulhar no sono. Deixei as especulações para mais tarde, incluindo a suspeita de que aquela voz poderia ser uma construção imagética de minha mente, num mecanismo compensatório salvador, para um momento de crise aguda.
À tarde, já nos estúdios da Aperipê TV, minutos antes de o programa ter início, Eugênia reapareceu-me e forneceu os devidos esclarecimentos sobre o que ocorrera. Estivera realmente ausente, pois aproveitara o momento de eu precisar estar mais intensamente em intercâmbio íntimo com Anacleto, para com ele reatar os laços profundos, e deliberou adiantar tarefas relevantes sob sua responsabilidade direta, com sua presença, pessoalmente. Mas, em momento algum, a palavra “substituição” tinha sido pronunciada até então, embora eu houvesse compreendido que assim acontecera (que ela fora substituída por Anacleto, e que eu não mais a veria, ou apenas usufruiria de contar com sua companhia muito esporadicamente). Tão-só, ele, que sempre foi o chefe maior de nossas atividades no Salto Quântico, estava mais diretamente em contato comigo a partir desta nova fase, sobremaneira nos preparativos e nas realizações das tarefas coletivas que exigiam minha atuação em público, como as aparições na televisão e o proferimento de palestras. Mas ela estaria igualmente comigo, praticamente realizando os mesmos trabalhos que já desdobrava em parceria com meus esforços.
Ironia das ironias – destes paradoxos típicos das manifestações do Plano Sublime na Terra –, de lá para cá, Eugênia tem entabulado diálogos comigo, mais longa e detalhadamente do que já vinha fazendo, ao mesmo passo que Anacleto se tem feito presente e atuante, como neste domingo, em que me orientou, minuciosamente, sobre o workshop que realizaria à noite, quanto acerca de perspectivas e planejamentos para os próximos passos de nossa Organização.
Em suma, podemos concluir que Deus, quando nos permite sofrer uma perda, tem como propósito ganhemos muito mais, logo adiante. Espero que esta minha confidência pública sirva de estímulo a que nossos leitores sempre e cada vez mais confiem na infinita bondade do Criador, a se manifestar das pequenas particularidades do cotidiano aos grandes acontecimentos de nossas existências.
(Texto redigido em 12 de fevereiro de 2008. Revisão de Delano Mothé.)