Delano Mothé – A senhora poderia nos trazer algum esclarecimento a respeito da passagem evangélica transcrita a seguir?
“Ainda não lestes esta Escritura: ‘A pedra que os edificadores rejeitaram, esta foi posta por cabeça de esquina. Isto foi feito pelo Senhor e é coisa maravilhosa aos nossos olhos’?” (Marcos, 12:10-11)
Espírito Eugênia-Aspásia – Em outras traduções, a expressão é “pedra angular”. Podemos facilmente depreender do exposto, nessa passagem evangélica, que aquilo que rejeitam os edificadores (ou seja, os que constroem a sociedade tal qual ela é, num dado momento e lugar) sinaliza, fortemente, um ponto de “virada”, qual a “pedra de esquina”, um vértice evolutivo dentro do contexto de certa cultura e época.
DM – E sobre esta outra?
“Tomando Maria uma libra de bálsamo de nardo puro, de grande preço, ungiu os pés de Jesus e enxugou-os com seus cabelos. A casa encheu-se do perfume do bálsamo. Mas Judas Iscariotes, um dos seus discípulos, aquele que o havia de trair, disse: ‘Por que não se vendeu este bálsamo por trezentos denários e não se deu aos pobres?’ Dizia isso não porque ele se interessasse pelos pobres, mas porque era ladrão e, tendo a bolsa, furtava o que nela lançavam.” (João, 12:3-6)
EEA – Judas fez a pergunta não porque fosse o traidor, conforme as tradições cristãs até hoje, equivocadamente, o interpretam (1), mas sim em virtude de, refinado na percepção das questões morais e espirituais, ter ficado de fato confuso com o aparente desperdício de recursos, qual se houvera uma aplicação indevida no ato da devota, um luxo sem propósito. Judas, inclusive, tinha consciência de que Jesus, que Se negara mesmo o título de bom (2), não aguardava essa ordem de atitude idolátrica. Entretanto, o Cristo Verbo da Verdade concedeu-nos, por provocação do mais controverso dos Apóstolos, uma nova exortação a que nos dediquemos ao essencial, em primeiro plano, para que as demais coisas ou questões em nossas existências nos sejam acrescentadas ou resolvidas em acréscimo (3).
DM – E sobre mais esta?
“Não te maravilhes de que Eu te tenha dito: Necessário vos é nascer de novo. O vento sopra onde quer; ouves-lhe o ruído, mas não sabes de onde vem, nem para onde vai. Assim acontece com aquele que nasceu do Espírito.” (João, 3:7-8)
EEA – Natural aos indivíduos a ideia de estabilidade, de permanência, de tranquilidade sobre conquistas feitas. O medo da mudança é um problema do ego humano. Todavia, para favorecer o progresso, com menor ônus cármico – já que a evolução se dá a favor ou a despeito da criatura –, pessoas e comunidades devem se abrir aos Fluxos da Divina Vontade, amiúde com disposições de destino bem diferentes das que costumam ser estabelecidas pelas programáticas e expectativas humanas, como boas rotas de acontecimentos. Por isso, a Fala aparentemente enigmática de Jesus: “O ‘Vento’ sopra para onde quer, não se sabe d’onde vem, nem para onde vai…” Na Antiguidade – como no grego antigo, em que primeiramente os Evangelhos foram grafados –, a palavra “pneuma” era aplicada não só para designar “vento”, mas também “Espírito” e “Deus”. A Vontade Divina, ou o Fluxo do “Pneuma”, é sempre inacessível, em última análise, porquanto a Inteligência Suprema não pode ser devassada pela inteligência humana.
(New Milford, Connecticut, EUA, 31 de outubro de 2014.)
(1) Confira “Diálogo sobre Judas Iscariotes e a bombástica revelação de ser ele o preferido de Jesus”.
(2) Marcos, 10:18.
(2) Mateus, 6:33.