Benjamin Teixeira
pelo espírito Eugênia.
Agora, quero que (…) ligue para (…), e lhe peça que pondere um pouco mais no que decidiu nesta manhã. Faço alusão ao seu projeto de ficar só toda a vida, no que concerne a relacionamentos românticos. Hoje em particular, ela estava fazendo esse tipo de reflexão: que não deseja ter ninguém, que ficará solteira, que se dedicará ao próximo.
Sim, maravilhoso o trabalho espiritual, a solidariedade, o afeto pelas multidões. Mas a questão é que ninguém é completo sem vivenciar a intimidade amorosa e sexual com outra pessoa. No nível humano, uma das experiências mais enriquecedoras que pode existir é justamente a vivência na intimidade – e a mais completa é a romântica-sexual – já que propicia o atrito de personalidades diversas, que são obrigadas a encontrar ajustamentos complexos, que transcendam as contradições superficiais entre seus modos distintos de ser.
Que, sim, não tenha pressa em encontrar o príncipe encantando, mesmo porque quem deve ser encantada é a própria alma, encantada pelo fascínio de Deus e Sua Perfeita Providência, promotora da verdadeira felicidade de indivíduos e coletividades. Somente após ter sido feito o essencial consigo mesmo: a conexão e alinhamento com o Criador e Seus desígnios para si, é que pode o indivíduo estar apto a atrair uma personalidade afim à sua, sem, portanto, jungir-se a experiências mais pungentes, nas duras pugnas do confronto entre caracteres antagônicos.
Que, sim, concentre-se e priorize as questões do espírito, de realização pessoal, profissional, vocacional. Mas que não feche as portas da alma à grande possibilidade evolutiva do relacionamento conjugal, uma das bênçãos mais férteis do Céu às criaturas do purgatório terreno.
Fugir aos relacionamentos íntimos pode ser tão-somente isso: uma fuga. A pretensão de superioridade pode, sorrateiramente, estar-se imiscuindo nas entranhas da alma, para roubar integridade, inteireza, saúde emocional e mesmo espiritual da pessoa, através da tese
puritana do celibato. O celibato é, em princípio, desnatural. Almas que atingiram o nível de serem inteiramente auto-suficientes no plano físico, fazem-no espontaneamente, sem demonstrar o menor laivo de frustração ou amargura – o que mui raramente se encontra entre apologistas do distanciamento afetivo. Amiúde, aqueles que se escondem por detrás desse rótulo, ocultam terríveis problemáticas sexuais, decorrentes de traumas dessa ou de outras vidas, ou encobrem – o que é ainda em diversas circunstâncias necessário – a sua condição homossexual, tiranicamente marginalizada na cultura machista e conservadora que ainda impera nas sociedades humanas de hoje. Mas mesmo esses não se devem conformar à solidão compulsória, abusivamente determinada pelos interesses mesquinhos das tradições primevas, e, ainda que à socapa, manter relacionamentos afetivos, para seu próprio bem e das pessoas a quem servem.
Não se ponha à distância dos relacionamentos íntimos. Justamente por o desejo, a posse, a busca de supremacia do ego e a queda de todas as máscaras da conveniência social acontecerem nos complicados e quase sempre dolorosos relacionamentos íntimos é que se tem neles uma espécie de catalisador do progresso psicológico e moral do indivíduo, um fermentador de valores e habilidades íntimas de sentir, superar-se, perdoar e amar.
Não por acaso Jesus disse: “onde dois ou mais estiverem juntos, eu me farei presente.” Ele poderia dizer onde “mais de um” estivesse presente Ele se faria presente. Quis destacar a relação dúplice, que se desdobra em filhos do casal, sejam biológicos ou não, sejam adotados ou apadrinhados, sejam crianças ou adultos protegidos, senão mesmo toda uma coletividade, porque quis estabelecer o Mestre que, a partir da célula da união integral entre dois seres, surgiria a energia suficiente de atrito, combustão, propulsão e transformação, para semear e fertilizar realizações de importância significativa para a humanidade, ainda que seja a humanidade daqueles apenas dois solitários sofredores domésticos, que se preparam para a eternidade de união completa com Deus e toda a comunidade dos Espíritos Puros.
(Texto recebido em 18 de outubro de 2002.)