Delano Mothé e Benjamin Teixeira,
em diálogo com o
Espírito Anacleto.

(Espírito Anacleto) – A castidade (mesmo que dentro de relacionamentos conjugais saudáveis – ou seja: a abstenção dos excessos), a contenção dos impulsos primitivos à promiscuidade indiscriminada do reino animal, o respeito ao direito de negativa do outro, pela consideração a seus sentimentos e escolhas pessoais, fizeram com que o estupro, a pedofilia e o incesto se convertessem em tabus internacionais, mas também em princípios criminógenos perfeitamente compreensíveis e igualmente considerados como generalizados e incontestáveis. Nesta época de acertadíssimo combate a preconceitos arquimilenares, libertando as almas da opressão e do obscurantismo medieval, importante não recairmos no outro extremo do espectro: desmerecer o valor dos fundamentos da sociedade, ou ela pode derruir sobre si mesma, implodindo-se pelos seus alicerces.

Adultério, traição de confiança, poligamia e outros itens menores de lesão moral a terceiros podem ser inclusos no mesmo âmbito principiológico do estupro ou do incesto, variando de grau, mas não de espécie. Estupro, por ser consensual, não perde seu caráter de estupro. Assim como a bigamia, o incesto ou a pedofilia, acontecendo sem reação da parte das vítimas, não deixam de ser atos hediondos, mesmo porque as vítimas podem se sentir sem alternativas, e, já acostumadas a abusos, acabarem por acatar uma indecência, como forma de não se desesperarem, em um contexto de muito baixa autoestima, de muita ausência de compensações psicológicas. Existem princípios universais de ética e responsabilidade que nos cabe respeitar, para não favorecermos a erosão dos mais estrategicamente relevantes pilares da civilização.

(Delano Mothé) – Desculpe-me, se eu estiver sendo inconveniente, mas me parece que os temas, muito complexos, foram simplificados demais.

(EA) – Não quero dizer que não existam casos de exceção, como, por exemplo: o da sexualidade infantil precoce, entre crianças mesmo praticada (sem que haja adultos ou adolescentes envolvidos). Por outro lado, não podemos afirmar que toda ordem de adultério seja condenável. Nosso Senhor Jesus, defendendo a mulher na iminência da lapidação (que se recusava envolver-se intimamente com o homem que não fora de sua escolha para o elo matrimonial, e sim de seu pai, para consorciar-se com aquele eleito por seu coração), igualmente descaracteriza a essência do adultério. Há casos de triangulações dolorosas que surgem, espontâneas, em períodos de transição entre casamentos que se esvaem para o fim e outras respeitáveis relações matrimoniais que têm início – tais triangulações, contudo, têm um cunho eminentemente transitório. Mas não podemos, por situações de exceção, estabelecer regras para a multidão, ou a indisciplina de massas ainda pouco afeitas ao respeito aos sentimentos alheios faria com que se rendessem a toda ordem de licenciosidades criminosas e dissipativas do lado melhor e mais nobre do ser humano.

(DM) – Perdoe-me, novamente, mas alguns pontos ainda me causam estranheza, como a associação (que considero perigosa) entre estupro e adultério, por exemplo.

(EA) – Estou falando em princípio do agir correto, em gradações variadas de erro. Por isso disse que, em escala menor, poderíamos incluir no mesmo princípio ambos os delitos. Seria o mesmo que falarmos de cargas de eletricidade: a contida em uma pilha comum, de controle remoto doméstico, e aquela que move a casa de máquinas de uma grande usina hidrelétrica, termelétrica ou nuclear – estamos falando de eletricidade sempre, embora em níveis de manifestação bem diversos. Graus de culpabilidade no erro, assim como os de carga elétrica na analogia citada, variam.

(DM) – Pessoas que têm inclinação ao adultério, à bigamia, ao incesto, o que devem fazer?

(EA) – Exatamente o que fazem todas as criaturas que portam tendências ao homicídio ou ao suicídio. Estou utilizando – sei disso – metáforas exacerbadas, mas o faço em caráter didático. Quando exemplificamos com situações caricaturais, o vício ou a falha do pensar e sentir incorretos ficam mais óbvios. Isso equivale ao princípio do roubo, por exemplo. Existem pessoas que supõem haver diferença entre roubar milhões do erário público e furtar folhas de papel da empresa em que laboram. O erro é o mesmo. O grau do erro é que foi diverso. O padrão de consciência é o que interessa e define o caráter do indivíduo, e este padrão do crime do furto está presente nos dois atos, não importando o grau da queda. Não pretendo, com isso, de modo algum, nivelar todo tipo criminal, em uma só categoria de culpabilidade – reitero. Isso seria defenestrar séculos de estudo de penalogia, criminologia e psicologia criminal. Apenas assevero que o bem é o bem em toda forma e nível de expressão, e que o mal é mal, ainda que se apresente de modo inocente e inofensivo, assim como uma pequena frincha em um dique, que pode pô-lo abaixo, com milhares de toneladas de concreto despencadas, num arrasamento de inundação em tragédia de proporções inqualificáveis. Também não tenciono, com estas palavras, sugerir que os discípulos da verdade se façam paranoicos e tentem se fazer perfeitos, da noite para o dia. Mas que se disciplinem no capítulo do essencial, começando pelos pontos mais graves, aqueles indicados por sua consciência, sobremaneira no sentido de investir em fazer o bem e não tanto em conter o mal, que, gradativa e naturalmente, será assimilado, por transmutação, nas potências internas da mente para o bem.

(DM) – Como entender, por exemplo, o caso de Jung, que se declarou polígamo, publicamente?

(EA) – Falha humana de um ser humano, honesto e transparente, que ousou declarar, de público, sua fraqueza, numa era de hipocrisias generalizadas – um grande feito, sem dúvida! Entrementes, por lhe valorizarmos a coragem e transparência, não se segue que concordemos com a conduta que confessou ter em sua vida afetiva íntima. As relações humanas devem se expandir em amor e felicidade, fraternidade e solidariedade, indulgência e ternura, mas no sentido das mães e pais que têm muitos rebentos, e passam a ver muitos outros, não biológicos, como seus filhos também, e não propriamente dos macacos bonobos, que resolvem suas pendências relacionais através de cópulas improvisadas. Toda a civilização humana foi constituída à base da contenção dos desejos e impulsos bestiais, em favor do equilíbrio e do bem comuns. Esquecer este princípio axial é renunciar a viver em sociedade e retornar à selva, ou, o que pior seria: propelirmo-nos ao armagedon. Temos que abolir preconceitos, precisamos ver negros, mulheres e gays, idosos, estrangeiros ou deficientes (físicos ou mentais) como pessoas de valor igual a quem não porte qualquer ordem de característica tida (social, cultural ou convencionalmente) como inferior. Mas daí a abrirmos a comporta para a licenciosidade crassa reside um abismo semelhante ao que há entre a prática das incisões cirúrgicas salvadoras de um médico em seu paciente, na mesa de operações e o retalhamento perverso de um maníaco em sua vítima indefesa, no set do crime hediondo.

Com relação a Jung e os trabalhos com a sombra psicológica, importante reforçar a diferença entre fantasiar e fazer. A fantasia, como mecanismo catártico de liberação e de elaboração de conteúdos pouco integrados à psique é de suprema importância ao desenvolvimento psicológico e espiritual de um indivíduo. O próprio mestre suíço asseverou, enfaticamente, que trabalhar com a sombra não é “cair na sombra” – ou seja: praticar, literalmente, o que ela sugere. Por outro lado, Jung, ao se referir à sua poligamia assumida, não a apresentou como um modelo a ser seguido ou uma virtude propalada, mas como um traço reconhecido de seu caráter que ele tinha dificuldade de valorar. Hoje, porém, compreende, perfeitamente, que se tratava de um aspecto a burilar em sua psique, sem desdouro algum ao edifício grandioso de sua obra lapidar de psicologia e psicanálise, legada ao gênero humano em sua última existência física.

(Benjamin Teixeira) – De minha parte, Anacleto, penso que, se a bigamia ou poligamia – e não a promiscuidade – fossem liberadas, muita gente que está sem parceiros afetivos teria oportunidade de vivenciar uma vida conjugal. Há uma certa disparidade de elementos disponíveis ao relacionamento, por motivos diversos, como a famosa “falta de homem no mercado”.

(EA) – Foco excessivo na questão romântico-sexual. Existe a sublimação e a realização de obras construtivas e de grande valor à sociedade que advêm exatamente da liberdade de não se estar envolvido num relacionamento conjugal, com todos os seus naturais dispêndios de tempo, energia e espaço mental. Freud mesmo chegou a afirmar que os maiores patrimônios da civilização eram devidos à sublimação dos excedentes da energia sexual.

Com isso, não estou proibindo – nem poderia –, nem dizendo que se deva proibir a existência da bigamia, por exemplo. Há minorias que têm tais características, que não são, nem de longe, as mais malevolentes da espécie. Existem, por outro lado, preconceitos crassos, no quesito de relacionamento com menores de idade, para disfarce à homofobia, por exemplo. O delito de sexo com menores é, por quase toda parte, confundido com o crime da pedofilia, que constitui, além de crime, uma enfermidade grave da alma. Em sociedades antigas, as relações extraconjugais eram punidas – as das mulheres, claro: os famosos casos de adultério, com as vergonhosas práticas de se “lavar a honra com sangue”, em que assassinos desatinados eram absolvidos por estarem movidos de possessividade declarada –, e isso nada tem a ver com moral e espiritualidade. Pedofilia é fazer sexo com crianças, e o pedófilo precisa ter 16 anos ou mais. Há prática sexual entre crianças que pode ser entendida como saudável, até certa medida. Já a relação entre um jovem de 21 anos com uma garota de 17 ou 16 anos é vista como perfeitamente compreensível, e acreditamos que seja, porque esta moça de 16 ou 17 anos já é uma adulta, biologicamente considerando-se. Quando a mesma diferença de idade, no entanto, ocorre entre pessoas do mesmo sexo, fala-se logo em “abuso de menores”, e muito rapidamente se descamba para a aplicação da pecha de pedofilia, com franca adulteração de semântica, e uma adulteração muito mal-intencionada, capciosa, diríamos, por parte de quem conhece os verdadeiros significados das palavras, e por ignorância de muitos, que se deixam arrastar, pela onda da “caça às bruxas”, que libera o instinto bestial humano a linchar e depredar elementos tidos como perigosos para a tribo…  hoje convertida em grandes megalópoles…

(DM) – Escusando-me pela insistência: o público tem condições de assimilar tais propostas? Não são elevadas demais?

(EA) – Muito pelo contrário, precisam ser ventiladas com muito zelo e mesmo repetição, para que as distinções indispensáveis sejam feitas, nesta era de liberação generalizada. A onda de liberação é irrefreável, histórica, irreversível. Temos apenas agora o dever de orientar a multidão, para que ela não entenda que vanguarda e bestialidade sejam conceitos equivalentes. Concordo com você que o trabalho é ingente e delicado. Há muitos conceitos complexos a serem elucidados, e tangenciamos apenas alguns, neste nosso diálogo, nesta era de desconstrução de mitos e crenças populares fossilizados. Precisamos transmitir ao populacho, acostumado a diálogos superficiais de folhetim televisivo, um domínio sobre conceitos e sobre discernimento de conceitos limítrofes muito fino… muito difícil de ser alcançado, por alguém antes da maturidade. Mas é este exatamente o desafio que se nos apresenta na modernidade, neste novo século que se inicia plenamente, na segunda década do século XXI, esta de 2010. Por exemplo: menininhas mal saídas da infância, sem sequer portarem seus corpos formados, vestem-se sumariamente, de modo claro a acicatar os instintos selváticos de homens adultos e maduros, em festas populares regadas a álcool nas pré-carnavalescas e nas próprias festividades do Carnaval. E ninguém, nem mesmo os pais que compraram as vestes e os “abadás”, autorizando-lhes a entrada nas festas, considera algo errado expor, antes do tempo e para estranhos, suas próprias filhinhas a uma iniciação sexual da pior natureza. O sexo é sagrado em todas as suas funções. É fisiológico, quanto espiritual. Só não é bestial, não no ser humano – pelo menos não deveria ser. Há traços óbvios de quase pedofilia, nestas ocasiões televisadas e documentadas fartamente, que são amplamente aceitos e vistos, publicamente, por enormes massas populares, com estas meninas seminuas arrastando-se ou sendo bolinadas por homens perfeitamente adultos, sob efeito de drogas diversas – elas e eles. Isso, realmente, demonstra um lamentável afrouxamento dos costumes, assertiva esta que, para não parecer moralista ou retrógrada, pode ser endossada pela opinião técnica de psicólogos da sexualidade humana, que lastrearão com ênfase e subscreverão, sem escrúpulos, a condenação que acabei de fazer à liberação generalizada da sexualidade humana que ora ocorre, nestes termos de leviandade e desrespeito aos sagrados patrimônios do sentimento, da dignidade e da estima por si próprio, sobretudo no que tange às mulheres em relação a si mesmas.

(DM) – Obrigado! Que cada um faça a melhor interpretação e aproveitamento de suas proposições…

(EA) – Exatamente. Que cada um aprenda a ouvir a voz do bom senso, dentro de si próprio, a voz da consciência, do sentimento de autoamor e autorrespeito, e certos excessos jamais acontecerão. O que ocorre é que há pessoas jovens demais sendo lançadas a situações de risco muito complexas, como a que me referi acima, das festas públicas regadas a drogas lícitas e ilícitas, e sem o acompanhamento, de perto, consciencioso e extremamente atento, de pais ou responsáveis adultos. Não pretendemos passar regras de conduta. Solicitamos, veementemente, que as pessoas retornem ao sentido de introspecção, de autoanálise, e que busquem o que realmente querem, o que de fato as faz felizes, e não simplesmente o desbragar-se no estouro da boiada, como se estivéssemos tratando com selvagens, seres irracionais, e não criaturas com potencial à angelitude, se não a grandes voos do gênio criativo humano, a espetaculares vivências de dignidade plenificante no seio das relações familiares, de qualquer gênero, sejam as formadas por laços tradicionais, sejam aquelas em que homossexuais ou amigos de vínculos não biológicos se reúnem para constituir suas pequenas aglomerações de amor, acolhimento e compromisso de apoio e proteção recíprocos, que podemos perfeitamente enquadrar na grande e sagrada categoria que submetemos ao rótulo de “lar”. Logo, a visão e o parecer aqui expendidos nada têm de preconceituosos ou anacrônicos; não pretendemos (nem ninguém poderá pretender, porque isso simplesmente seria vão) deter o movimento de liberação dos costumes. Mesmo porque este movimento é saudável. É evolutivo. Aludimos, entrementes, aos critérios construtivos de um desenvolvimento. A metáfora da multiplicação celular de um organismo é muito clara para elucidar nosso ponto de vista. Células que se multiplicam demais consistem em núcleos cancerosos. Há modernidades que não são realmente itens evolutivos (embora pareçam) e sim cânceres no seio das comunidades, que precisam ser extirpados (e o serão, em seu tempo – não se tenha disso a mínima dúvida, porque Deus vela). Por ora, todavia, como disse Nosso Senhor Jesus, é momento de o joio e o trigo crescerem juntos. Somente a posteriori teremos condições, com perspectiva histórica bastante, para fazer uma triagem segura, com respeito ao livre-arbítrio dos encarnados e as conclusões a que houverem chegado por sua própria experiência, nestes âmbitos tão intrincados da moral e da fé.

(Diálogo mediúnico travado em 28 de março de 2010.)


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