Benjamin Teixeira
pelo espírito
Dr. Demétrius.


Diante de questões por demais complexas, deixe que o inconsciente processe seus conteúdos. Não pretenda, “a toque de caixa”, “da noite para o dia”, resolver problemas que demandam tempo de digestão psicológica, nos corredores viscerais do psiquismo. Assim, permita transformar decisões em eventos, em vez de encará-las como realizações, e, portanto, como obrigações suas, como deliberações que você deva tomar, porque vai ficar paralisado na terrível sensação de impotência que o ego-racional fica, ante o psíquico. Processos psicológicos são fenômenos que acontecem, que surgem, que espocam para a consciência, após um ritmo próprio de maturação ter sido consumido; e não tarefas que se realizam, trabalhos de que se desincumbe, como quem empacota ou desempacota embrulhos.

Evidentemente que não estou falando de negligenciarem-se medidas essenciais de iniciativa pessoal. Ler sobre o assunto em torno do qual gravita a problemática vivida, consultar-se com gente mais experiente, tentar, racionalmente, descobrir alternativas de solução são deveres impostergáveis e óbvios, que nem nos damos ao trabalho de enunciar, pressupondo que o leitor, além de conhecer tais atividades como responsabilidade pessoal, já as desdobra sistematicamente. Quero dizer que, após fazer tudo que se espera de uma mente lúcida e responsável, a pendência ainda irresolúvel, por fim, deve ser confiada ao campo do imponderável, do imprevisível e, também, paradoxalmente, do invencível – porque Divino.

É imprescindível, para a consciência que deseje gravitar um pouco acima da mediocridade analítica da mente racional – que lida com poucas variáveis de cada vez e que se confunde e colapsa com situações reais, sempre complexas demais para serem reduzidas a poucas variáveis –, que o indivíduo açambarque, para si, a atribuição de se empenhar por renunciar ao controle sobre os acontecimentos e processos de acontecimento da própria vida, e, assim fluir com o curso da própria existência, respeitar as correntezas da vida, sentir, intuir, criar, deixar-se levar… entregar… Um desafio que pode parecer simples, à primeira vista, mas que causa verdadeiras vertigens psicológicas em psiques amadurecidas e esclarecidas da Terra, quando não as compele a arrasadores crises existenciais, de identidade e significado da vida.

Para isso, porém, urge abdicar do orgulho. O ego, com sua ciosa ilusão de poder, de controle de si mesmo e do mundo em volta, deve renunciar a se supor o que não é, porque, de fato, uma análise acurada sempre revelará sua impotência para gerir a vida. Assim, remetemo-nos a Jesus, quando disse que, para entrar no “Reino dos Céus”, ou seja: da realização plena como ser consciente, é necessário assemelhar-se a uma criança. A postura humilde, de abertura ao novo e ao outro, à mudança e à diferença, inerente à mente infantil, é o caminho indispensável, não só da paz consigo mesmo e com o mundo externo, mas mesmo de uma função psíquica saudável, já que a cristalização numa identidade impede o livro fluxo de informações com outros universos de conteúdo e significado, com que toda criatura pode intercambiar, a todo tempo. Desistir de viver no castelo do ego e suas máscaras, as torres e canhões que guarnecem o feudo limitado da consciência excessivamente racional, gera, a longo prazo, surpresas fantásticas, como descobrir que o “mundo perigoso” de que se protegia era, em verdade, seu próprio cosmo de possibilidades infinitas de crescimento e de maior vida e felicidade, por conseqüência.

Medite com cuidado sobre tudo isto, e tente, dentro do possível, aplicar as conclusões. Mas não o faça sem ajuda profissional, de terapeutas ou conselheiros espirituais devidamente gabaritados para tanto, porque, esteja certo: “o mundo inteiro” levantar-se-á contra sua intenção de seguir para a Luz da consciência do Eu Total, a começar pelas sub-personalidades constituintes de sua própria natureza. Forças externas e internas a você pugnarão por impedi-lo por bloquear-lhe o livre acesso aos seus aspectos divinos embrionários.

Não se impressione com a sensação de fragilidade típica ao arquétipo da criança interior. O “puer aeternus”, este padrão de reverência ante a complexidade e enormidade da vida, caracteriza-se não só por este traço de lucidez do sentir-se pequeno ante a grandeza infinita da vida, como, em contrapartida, traz em gérmen o potencial divino de tudo realizar e desdobrar, superar e transformar, porque constitui o canal por onde as forças criativas, renovadoras e plenificantes do universo se manifestam para a criatura.

Por fim, ore sempre e confie-se a Deus, porque somente com a Luz d’Ele é possível realizar-se o impossível: transcender a dimensão humana de existência e começar a tocar a esfera divina de consciência.

(Texto recebido em 23 de junho de 2005.)