por Benjamin Teixeira.
Amigo:
Meu mundo estava vazio, sem graça, sem sentido, raso e tolo – você, com sua amizade, preencheu, deu vida, propósito e profundidade à minha existência.
Estava perdido, desnorteado, tonto e confuso, angustiado e esquecido de mim mesmo. Você se fez o norte para tudo, auxiliou-me com sua ponderação, vitalizou-me com seu estímulo, fez-me voltar para mim mesmo e cuidar de minha pessoa, reativou meus talentos que morriam, e catalisou meu destino, propelindo-me a me tornar tudo que deveria ser.
Estava, por tantas desilusões, desacreditado do amor, da dignidade, do bem e da verdade do ser humano – você, em silêncio, mas com sua presença inteira e forte, eliminou todas lacunas e me compensou por decepções, elidindo todos os porquês, dirimindo todas as dúvidas sobre o valor da espécie humana.
Eles, gentis, sorriam, mas se desculpavam quando eu realmente precisava. Você, rude, esteve presente, deu-me a mão e levantou-me, quando todos me deram as costas.
Eles, falantes, prometeram mil serviços, compromissos e realizações. Você, dizendo-se incapaz e sem ânimo, fez tudo que ninguém fez e mais do que você próprio supunha-se um dia poder vir a realizar.
Eles, políticos, diziam palavras agradáveis, para me seduzir, caluniando-me às costas, enquanto gozavam de minha amizade. Você, sempre franco, falava o que ninguém teria coragem para mim, com o fito de me emendar e melhorar, mas me defendia, com o corpo e a alma, meu nome e minha pessoa, onde quer e com quem estivesse.
Eles, dizendo-se desinteressados, só estavam comigo enquanto seus interesses eram atendidos, afastando-se cheios de justificativas elaboradas e polidas logo que a situação lhes exigia devotamento. Você, dizendo-se mesquinho e abaixo da tarefa, parou sua vida, abdicou de tudo, renunciou ao mundo, esqueceu seu prazer e sua felicidade, e colocou-se ao meu lado, jornadeando comigo a minha trajetória.
Eles introduziram-se em minha vida, nos meus momentos de alegria, sequiosos de usufruir do que não fizeram por merecer, ansiosos por dividir méritos das obras que não ajudaram a edificar. Você foi a eminência parda de todas as horas, participando de tudo dos bastidores, sem ninguém notar, dedicando-se e se sacrificando sem que eu pedisse, e ainda continuou sem reconhecer os próprios méritos, sempre desejoso de manter-se oculto, na penumbra do anonimato.
Eles conhecem o homem externo, público, vitorioso, realizador, e ainda encontram faltas, nos meus pontos fortes. Você conhece todas as minhas fraquezas, e me quer bem mesmo assim, e enxerga pureza, bondade e boas intenções onde ninguém mais divisou.
Eles querem tudo receber, beneficiarem-se, aproveitar. Você está sempre pensando no que pode dar, em como pode ajudar, no que pode ser útil.
Outros me querem a presença de Deus. Você se fez a presença de Deus em minha vida…
Por tudo isso e tanto que não pode ser descrito, amigo, só posso lhe dizer: não há palavras que dimensionem o seu valor, o seu caráter, a sua lealdade, o seu devotamento. Um cavaleiro medieval? Um monge oriental? Um santo guerreiro? Ou um guerreiro santo? Não sei como enquadrá-lo nos mitos pobres e nos esquemas estreitos de nossa cultura, porque, humano, você se fez gente mais do que todas as gentes que conheci, e angelical, nas intenções e no desejo de servir, fez-se mais nobre que as virtudes de todos que se arrogaram ajudar-me, sem nenhuma obrigação para tal, mas tratando o convite a participar da obra que propus, como um dever de consciência. Só sei que posso encaixá-lo, em qualquer arquétipo de herói, de amigo, de homem bom e justo, de ser humano, pleno e correto – porque, na verdade, nenhum deles é suficiente para descrevê-lo à altura e completamente.
Você, amigo, é o retrato de tudo que a humanidade precisa se tornar, para que cesse o reinado das hipocrisias, do interesse subalterno, da venalidade e do egoísmo, e adentremos, efetivamente, na era da felicidade, da concórdia e da paz, quando não haverá mais guerras, nem ódios, nem rancores, nem dissimulações, mas somente a verdade e o amor, esses dois valores de que parece você ser a encarnação viva…
A você, amigo, por tudo que fez por mim e pelo trabalho que faço e que não me pertence, que nunca poderei pagar, só posso realmente dizer, com a certeza de que traço uma profecia, ao reverso de meramente expender um desejo vão:
Deus lhe pague.
Post Scriptum, para os leitores do Site:
As pessoas costumam desejar a presença de pessoas especiais em sua vida, como se tratasse essa ocorrência de um capricho da sorte. Por natural decorrência desse raciocínio, sentem-se injustiçadas e infelizes, por estarem cercadas de pessoas indignas ou insensíveis, que julgam não estar à altura de seus valores e de seu coração, freqüentemente invejando companhias alheias que muito mais freqüentemente ainda não são tão especiais como parecem.
Por mais que achemos estranho, entrementes, é lei psicológica e espiritual que atraímos o que somos e que toda vez que só nos vemos cercados de gente pérfida, bruta e manipuladora, sem notar exceções, é sinal de que devemos voltar nosso olhar crítico um pouco mais para nós mesmos. Algo em nossa natureza arrasta, como um ímã, tais pessoas em nossa direção.
É fácil sentir-se vitimizado, infeliz e isolado. Isso, porém, não só é uma inverdade, como uma grande estupidez, uma atitude nada prática, que só acentua o problema, sem dar nenhuma chance à sua resolução. Ninguém terá grandes amigos ao seu lado, sem primeiro se tornar um grande amigo para os outros. Têm grandes amigos aqueles que primeiramente silenciaram seu egoísmo, para pensar no outro e olhar para o próximo e suas necessidades.
Quem se diz ter sido bom amigo dos outros, mas que deixou de sê-lo por ter sido traído, só estava em busca de receber alguma coisa em troca do que não se pode comerciar, em nenhum momento portanto tendo sido uma alma boa de verdade. Quem é amigo verdadeiramente, sofre com as decepções, enraiva-se, entristece-se, mas continua sendo amigo, não necessariamente de quem traiu, mas de outras pessoas, porque atende a um apelo irresistível de sua natureza, do nível evolutivo a que chegou. O que se é, não se deixa de ser jamais.
Pessoas especiais em nossas vidas são um prêmio para o nosso processo de auto-descoberta e melhora íntima e não o inverso, como se imagina. As pessoas aguardam que primeiro cheguem os anjos, para que depois se angelizem. O trabalho de auto-reforma é de responsabilidade inteiramente nosso, intransferível, e enquanto aguardamos a solução de fora, jamais encontraremos sossego e satisfação para nossas almas, jornadeando entre uma decepção e outra.
Você quer ter grandes amigos, almas gêmeas ao seu lado, pessoas puras e boas? Talvez até mesmo já as tenha e não haja percebido. A questão toda é que não se trata de algo acontecer fora, mas seu foco mental mudar por dentro, e aí, então, o universo transformar-se-á para você, e os anjos surgirão aos seus olhos, talvez bem mais perto do que possa imaginar…
Como disse Jesus, quem tiver olhos de ver e ouvidos de ouvir, que veja… que ouça…
(Texto redigido em 5 de agosto de 2002.)