Querida amiga:
Hoje me dirijo em particular a você, companheira do sexo feminino, aproveitando o ensejo do dia internacional da mulher.
É verdade que muitas conquistas ainda restam ser feitas, para assumirmos a nossa plena dignidade nas relações sociais. Há discriminação expressa e velada, e, quando se faz subliminar, de fato é altamente prejudicial. O mundo ainda é dos homens.
Todavia, não é razoável, nem justo, nem lógico nos entregarmos a lamúrias, quando tanto já há para comemorar. Os protestos, as reivindicações e as campanhas pela melhoria da condição da mulher em sociedade devem prosseguir, infatigáveis. A conformação é atitude de covardes e irresponsáveis. Entretanto, não é prático vivermos engolfadas em revolta e angústia contra o que ainda somos impotentes: o sistema e suas cristalizações arquimilenares de desprezo e opressão do sexo feminino.
Há pouco mais de um século, poucas de nós eram alfabetizadas. Há menos de cem anos, adquirimos, nas nações mais desenvolvidas da Terra, o direito ao voto. Há menos tempo ainda, no Brasil, por exemplo, que tem uma das mais avançadas legislações do globo, em 1962, tivemos o direito de nos tornar chefes de família, condição exclusivamente reservada a nossos pares masculinos, até então.
Há muito pouco tempo, mulher não se envolvia em assuntos de homem, não podia tratar de filosofia, política, economia, sociologia ou quaisquer questões que dissessem respeito aos destinos da Humanidade. Até mesmo nas artes, onde sempre tivemos espaço relativamente garantido, os homens assumiam as posições de destaque, não sendo por outra razão que o ballet surgiu, na França de há mais de quatrocentos anos, com homens travestidos de mulher. Não por outra razão, o canto erudito, um pouco antes, era tomado de castratis, a aberração deprimente, retrato trágico dos extremos a que chegou o patriarcalismo na cultura ocidental: homens eram literalmente castrados, antes da puberdade, para que suas vozes não adquirissem características masculinas, sob o efeito do amadurecimento sexual. Castravam-se homens, para que cantassem como mulheres… Criava-se um Frankstein sexual, que não era homem e também não era mulher, apenas para não se ceder espaço à metade da espécie humana que nasceu com órgãos sexuais femininos.
Esse último tópico nos chama bem a atenção para o fato de que os homens têm sido as maiores vítimas, nesses séculos sucessivos de machismo. O feitiço – como reza o ditado popular – virou-se contra o feiticeiro. Hoje, os homens são castrados em diversos níveis de seu ser. Castrados nos sentimentos, castrados na capacidade de amar. Castrados na intuição, castrados na criatividade. Castrados na capacidade de lidar com questões emocionais, religiosas, místicas. Castrados na capacidade de viver em sociedade, de aprofundar relacionamentos interpessoais. Castrados na alma…
Dizendo isso, vejo agora as amigas mulheres menearem a cabeça, enfaticamente, concordando com as ideias que estou a expender. E os pobres companheiros do sexo masculino que me leem, entristecem-se, e, se forem realmente cônscios do prejuízo que a cultura lhes impôs, que ainda lhes impõe, vão, lamentavelmente, também reconhecer que estou certa. Não é por outra razão, nessa era de transformações rápidas, em que a adaptabilidade e a presteza contam tanto, que as mulheres estão tomando expressividade cada vez maior: elas aprenderam a lidar com terreno hostil. E, agora, como têm liberdade para agir, conseguem conjugar novos compromissos e atividades, vencendo, galhardamente, nesse mundo em que expansividade, facilidade de comunicação, estabelecimento de redes de relações e criatividade ( elementos tão presentes nas mulheres e tão precários nos homens) se fazem atributos imprescindíveis, tanto para atingir a excelência profissional, como para ter êxito na vida pessoal, afetiva e familiar.
Assim, da próxima vez que se vir tentada a ver os homens com maus olhos, a atacá-los ou depreciá-los, sentindo-se injustiçada e preterida, lembre-se da imagem dos castratis, e tenha certeza: eles estão em muito pior situação hoje do que estavam os cantores bizarros de antanho. Aqueles eram castrados no corpo, eram poucos e reduzidos a redutos de culto à música. Hoje, são castrados na alma, e vivem aos milhões, em toda parte, mascarados de homens fortes e poderosos, mas frágeis, carentes e angustiados por dentro, dissimulando o próprio desespero com a capa da segurança artificial com que se travestem.
Você, mulher moderna, que absorve as funções de mãe, mulher, profissional, cidadã e ser espiritual, sem negligenciar nenhuma delas, é modelo do ser humano do futuro, protótipo dos líderes e destaques de uma era que já começou sem dar aviso prévio, preparada que já está para enfrentar os desafios complexos do amanhã. Quanto a eles, apiede-se… a maior parte está em péssimos lençóis…
Eugênia-Aspásia (Espírito)
Benjamin Teixeira de Aguiar (médium)
8 de março de 2001