Crônicas de Gustavo Henrique

Benjamin Teixeira
pelo espírito
Gustavo Henrique.

1277, Portugal. O idioma de Camões mal havia surgido como língua independente. Um dialeto confuso era a semente do atual quarto mais difícil vernáculo da Terra, e misturava latim – dada a ocupação romana do início da era cristã – a vocábulos e construções fraseológicas provenientes de visigodos e mouros, que, no correr de milênios (quanto aos primeiros) e de séculos (em relação aos segundos), viveram naquela região.

A pouco mais de 100 km da capital portuguesa, um senhor feudal vivia faustoso – para os padrões da época. Ele e seu filho adolescente mantinham uma relação doentia. Viúvo desde o nascimento deste seu primogênito, não contraiu novas núpcias nem tivera novos filhos. Homossexual reprimido em seus instintos, consorciara-se apenas para constar socialmente que podia gerar filhos. O garoto cresceu e o senhor feudal desenvolveu por ele estranha paixão. Mal saído da infância, convidou-o a dormir em seu quarto. E, a partir de apenas 12 anos de idade, o menino, que levava seu nome, tornou-se seu amante. Lamentavelmente, a homossexualidade contida, em sua mente com traços criminógenos, degenerou para pedofilia, aturdindo-o e, principalmente, a pobre mente do menino, indefeso para a crise de uma sexualidade incestuosa e proibida.

O final do século XIII se aproximava e, com ele, a adultidade do rapaz que, no ano que anunciamos, completava 18 anos. Seu pai retirou-se em viagem, para assuntos de monta, a convite do monarca lisboeta, com quem entretinha laços de suserania. Deixou o filho adolescente representando-o na administração do palácio e do feudo, e o jovem, em sua ausência, contraiu fulminante febre tifóide, desencarnando em menos de uma semana após as primeiras manifestações da enfermidade. O grande espírito se libertou. Era sua mãe espiritual, que descera em condição de filho seu, para inspirar-lhe ternura e transformação moral, o que ele, lamentavelmente, não soubera apreciar e assimilar, para se transformar.

Setecentos anos mais tarde, vemo-los mais uma vez encarnados juntos, em terras brasileiras. Desta vez, a mãe pelo coração pedira para nascer como realmente sua mãe biológica, para melhor lhe instilar noções de respeito ao próximo e a si mesmo, e o senhor feudal, então, seria seu rebento, novamente, como em tempos prístinos, em reencarnações bem anteriores à do século XIII. Ainda vivendo o problema da homossexualidade não aceita e mal-conduzida, enveredou pela igreja católica, repetindo o vício de antanho. A mãe desencarnou desgostosa, mais uma vez, e o padre católico viveu, na surdina, sua tendência criminosa, passando à dimensão extra-física de vida em deplorável condição moral e espiritual, na metade do século passado.

Ó, humanidade, humanidade! Quando o preconceito deixará de fazer morada em seu coração? Quando se compreenderá que um décimo dos contingentes humanos é composto por homossexuais e que somente a dignidade da aceitação pública de fatia tão expressiva da espécie poderá permitir paz e equilíbrio a todo o tecido social? Quando se compreenderá que almas de escol nascem em condição sexualmente invertida (homossexual), como o primogênito do senhor feudal, tanto quanto outras, fracas psicológica e moralmente, degeneram-se ainda mais com a pressão e escárnio sociais, com a falta de civilidade no trato com a questão gay em praticamente todas as culturas do planeta?

Que Hollywood e o telenovelismo brasileiro continuem fazendo alarde da temática, abrindo os olhos dos incautos para este antigo e medonho flagelo humano, fazendo ver que o mal não está no sexo, mas sim, na sua repressão e má educação. Enquanto se forçarem celibato de uns e heterossexualidade impossível de outros, degenerescências lamentáveis como a pedofilia campearão vitoriosas e cínicas, fazendo vítimas e tragédias vivas em magotes infinitos…

(Texto psicografado por Benjamin Teixeira. Revisão de Delano Mothé.)