(Benjamin Teixeira de Aguiar) – Prezada Eugênia, aos 6 de dezembro de 2008, em diálogo reservado comigo, você propôs que nos desligássemos oficialmente do movimento espírita e do espiritismo como religião formal, sugerindo inclusive que deixássemos de nos denominar “espíritas”. Poderia nos dizer alguma coisa sobre essa sua proposição, que levamos a efeito na palestra pública do dia 14 de dezembro daquele mesmo ano?
(Eugênia-Aspásia) – Sim, com satisfação. Foi apenas uma consequência natural do amadurecimento de nossa instituição, que, desde o berço, gozava de vocação ao ecumenismo, a uma visão plural e não discriminatória de outras expressões de fé, ao combate a toda ordem de preconceitos, quais os atinentes a gênero, sexo, raça ou origem sociocultural.
Não somos espíritas, embora possamos assim nos dizer, quando interpretamos o termo em sua acepção lato sensu, referindo-nos a todos(as) que aceitamos estes princípios universais: 1) imortalidade da alma, 2) comunicabilidade entre as dimensões física e extrafísica de vida e 3) reencarnação – como meio de se processar a evolução da consciência, rumo à definitiva imersão no seio do(a) Criador(a).
É uma tendência dominante, nos ambientes cultos do planeta, o afastamento de todos os “ismos”, para que se propicie a lídima fraternidade entre indivíduos e nações. Os excessos fratricidas do fanatismo religioso, perpetrados entre muçulmanos(as) e judeus(ias), no recente recrudescimento dos conflitos na Faixa de Gaza – sem desrespeito às outras causas da complexa etiologia da contenda –, demonstram como a intolerância, o sectarismo e o proselitismo constituem fatores poderosos de devastação da dignidade humana e dos valores mais nobres que nos tipificam a natureza de legatários(as) da Eternidade. A história é rica em confrontos de credos que enlouqueceram comunidades inteiras, propelindo povos, ainda que pacíficos, à sanha belicosa e genocida.
Nosso Senhor Jesus asseverou que, um dia, o(a) Pai(Mãe) seria adorado(a) em Espírito e Verdade. Gautama Buda recomendou que as ideias de terceiros deveriam sempre se submeter ao endosso da própria experiência de quem as recebe, não importando a procedência dos conceitos ou a suposta autoridade intelecto-moral de seus(suas) proponentes, ou seja: nem mesmo as palavras do príncipe iluminado poderiam ser levadas à conta de verdade absoluta. Lao Tsé, um sábio eremita, nunca preconizou a instauração de uma nova tradição espiritual. Confúcio, igualmente, não criou religião alguma, avesso que era a práticas de insulamento do ser em redutos de crença particular. Observe-se que citamos as pedras fundamentais de quatro das maiores religiões do globo, respectivamente: cristianismo, budismo, taoísmo e confucionismo.
Quando partimos para o campo dos estudos mais laicos e científicos, então, a ideologia da não filiação religiosa é apregoada com severidade ainda maior. Para dar uma noção de quão grave é a abordagem da psicologia sobre o tema, o grande especialista em questões profundas da psique Carl G. Jung, acusado de “místico” (no sentido pejorativo do vocábulo) por correntes mais conservadoras e pela maioria esmagadora das academias psiquiátricas e psicológicas até hoje (portanto, uma voz da área com certa abertura a oferecer respaldo à religiosidade), chegou a asseverar, categoricamente, que as religiões são inimigas da autêntica busca espiritual.
Com isso, não estamos, de modo algum, nos colocando contra religiões ou contra seus(suas) adeptos(as). Partidos de crença continuarão a existir, por séculos. No entanto, precisamos compreender e promover, mormente entre os(as) próprios(as) profitentes dessas doutrinas formais, o espírito de convivência pacífica entre todas as criaturas, a despeito de qualquer elemento de identidade religiosa, política, cultural, racial, sexual etc.
Há personalidades que precisam (e continuarão precisando, por muito tempo ainda) se vincular a religiões convencionais, em cuja congregação podem realizar o bem largamente, para si mesmos(as) e para quantos(as) estejam em seu raio de influência pessoal, desde que logrem extrair os ensinamentos primaciais de sua principiologia religiosa, já que todo colégio de espiritualidade genuína lastreia-se no postulado axial do amor. No instante, todavia, em que o desprezo e o ataque a outras manifestações de fé começam a surgir, as forças do mal se agregam para neutralizar quaisquer iniciativas benevolentes que poderiam acontecer por meio da conexão mística que o(a) devoto(a) originalmente almejava estabelecer com o Alto, sob a inspiração de seu cânone de dogmas.
(BTA) – Como então podemos definir o Instituto Salto Quântico, a partir de agora?
(EA) – Como uma escola de pensamento espiritual com feição cristã. Não podemos negar nossas origens nem os princípios que esposamos, porquanto temos como Mestre Supremo, em nosso educandário, a Figura Venerável de Nosso Senhor Jesus Cristo.
(BTA) – E como podem denominar-se os(as) que acompanham as atividades de nossa organização ou se afinam com as ideias que propalamos, ainda que o façam à distância, assistindo aos programas de TV ou lendo as mensagens mediúnicas publicadas em nosso site e compiladas em nossos livros?
(EA) – Não precisam se denominar de nada (risos). A necessidade de rótulos, por si só, já representa uma problemática a ser debelada, por revelar que, subliminarmente, a pessoa se sente obrigada a encaixar-se nas informações da embalagem ideológica, em vez de priorizar, em sua forma de avaliar o mundo e conduzir sua existência, o que provém das entranhas de sua essência espiritual, com legítima base divina, tal qual faziam e fazem todos(as) os(as) gurus, luminares e mestres(as), encarnados(as) ou desencarnados(as), do presente e do passado, desta ou de outras culturas.
Obviamente, o bom senso e a lucidez aprovam o impulso de reverência àqueles(as) que jornadeiam na vanguarda do trajeto evolucional, até mesmo para que possamos crescer mais, aprendendo com suas lições e exemplos avançados. Entretanto, não devemos obediência absoluta a nada nem a ninguém, mas apenas à própria consciência, cujos alvitres, ouvidos com apuro, favorecer-nos-ão a descoberta de caminhos progressivamente mais condizentes com o respeito às nossas idiossincrasias e, concomitantemente, com o acatamento voluntário a preceitos intemporais de convivência pacífica e solidária com nossos(as) irmãos(ãs) em humanidade, quanto com outras espécies e com a Criação Divina como um Todo.
Mas, em percebendo uma necessidade maior de definição pública de fé, os(as) amigos(as) que nos seguem as orientações religiofilosóficas podem livremente dizer-se cristãos(ãs), ou espiritualistas, ou estudantes de espiritualidade, ou mesmo espíritas (no significado amplo a que aludimos), como queiram…
(BTA) – Interessante. Mais algo a declarar sobre este assunto?
(EA) – Não. Agradecida pela oportunidade ofertada ao esclarecimento da delicada temática.
Benjamin Teixeira de Aguiar (médium)
em diálogo com Eugênia-Aspásia (Espírito)
1º de março de 2009