Benjamin Teixeira
pelo espírito
Anacleto.

(Fui conduzido, mentalmente, por Eugênia, a uma praia distante e deserta. Sentado em uma pedra artisticamente emoldurada pela natureza, esperava-me o sábio Anacleto, para uma aula relâmpago, fitando o infinito do horizonte. Grave, sem dizer palavra e apresentar um único sorriso – bem característico seu – levantou-se da pedra, com minha chegada e disse, sem mover os lábios, mentalmente, fitando-me com seus penetrantes e miúdos olhos azuis com o que começamos, então, a conversar telepaticamente:)

Aprochegue-se.
Quero que olhe para essa pedrinha em minha mão. O que vê nela?

Nada em especial. Ela parece ter uma protuberância… marronzinha… não sei o que dizer…

Ela é um fóssil. Um fóssil pode passar por uma pedra, ou uma pedra por um fóssil. Na verdade, sendo mais preciso, é uma pedra que é um fóssil. E o que dá a diferença entre uma pedra simplesmente e um fóssil?

Sua origem? Seu significado?

Uma e outra coisa. Mas não é a isso que quero chamar a atenção, mas à interpretação errônea que com muita freqüência as pessoas fazem de coisas, acontecimentos e pessoas. Muitas vezes, vê-se significado, importância e problema onde eles, na verdade, não existem, ou se os despreza onde de fato estão.

Agora veja isso aqui. Consegue enxergar?

Não sei se vejo… Um chaveiro?… mas sem chaves?…

Exatamente. Um chaveiro sem as chaves. A grande questão é que as pessoas estão sempre em busca de chaves para abrir portas que, na verdade, não existem. Todas as portas e todas as chaves estão para dentro da criatura. Quando o reino dos céus, como disse o Cristo, é achado, tudo o mais vem por acréscimo. Quando há um pleno encontro consigo próprio, centrando-se no próprio eixo de sabedoria e verdade, no cerne da consciência; quando se sabe o que é, o que se quer e para onde se vai, todos os dramas da vida são simplificados, e tudo flui, calma e eficientemente.

Agora, quero concluir nossa rápida conversação com esse último elemento que trouxe à mão. Pode vê-lo?

Uma carranca, em miniatura?

Exatamente. É o nível de importância que se deve dar aos medos. Não são de fato substanciais e perigosos como se imagina. Não se deve ser temerário, mas dimensionar corretamente os medos, a fim de que a obra de auto-realização não seja prejudicada, bloqueada ou adulterada. Os medos são dos maiores obstáculos à realização plena da alma. Por isso, dar-lhes a devida proporção, por uma perspectiva mais ampla que seja adotada, como a da vida eterna, favorece a caminhada da ascese.

Tem mais alguma coisa a dizer?

Não. Vemo-nos depois.

(Após isso, Anacleto voltou a fitar o oceano, meditativo, sem maiores cerimônias, enquanto eu recuava, sob comando de Eugênia, ao estado normal de consciência, até a imagem de Anacleto desaparecer completamente, de meu campo visual)

(Diálogo travado em 6 de dezembro de 2001.)