Eugênia-Aspásia – Quem você pensa ser? Qual sua função nesta existência? Ao meditar sobre essas questões axiais, seminais, o resto se lhe fará mais claro, cristalino como a luz do luar…
Benjamin Teixeira de Aguiar – “Luz do luar” não é algo muito definido… A metáfora que você quis utilizar foi essa mesmo? Talvez pretendesse dizer “claro como a luz do Sol”…
EA – Quis dizer exatamente o que você psicografou. Tudo que pertence ao universo da consciência humana tem característica crepuscular. Nada na psique é solar – sem espaço a dúvidas, a incertezas, a imprevisibilidades. Contudo, a luminosidade suave de uma noite de lua cheia representa bem aquilo que, no plano da alma, pode ser considerado como seguro, sólido, profundo, verdadeiro. Esta é uma das pressuposições mais importantes a se ter em mente, no que concerne ao universo interior humano: a de que não se pode viver em busca de certezas concretas demais a respeito de nada. A ausência dessa percepção-convicção favorece a tomada dos mais perigosos e autodestrutivos rumos existenciais.
BTA – Onde você está, ao certo¹, mamãe² ?
EA – Quanta linearidade! (risos) E importa realmente onde eu esteja? Por que a confusão, se posso estar em mais de um lugar ao mesmo tempo?
BTA – Sim… a ubiquidade…
EA – Melhor falar em não localidade, em emaranhamento quântico ³. Sei que está um pouco atordoado com todos esses ambientes. Mas, meu filho: pretendo demonstrar, com isso, que existem infinitas possibilidades na Criação Divina, e que só ficamos entediados se quisermos, porquanto sempre há novos universos dentro de universos a serem explorados, conhecidos e, principalmente, vividos.
Fixe seu coração no fundamental, que acabou de ser estudado⁴. O que você sente tê-lo trazido até o atual ponto de realizações em sua presente reencarnação? Caos, criatividade, flexibilidade, abertura (conscienciosa) à transgressão⁵, energia para a transformação e a inovação – não é mesmo?… Sendo assim, não pode jamais afastar-se do essencial, em matéria de administração de sua vida, o “ativo” que mais lhe garantiu crescimento: sua originalidade altiva e “desordenada”⁶, em relação a convenções, à cultura, à família, ao mundo acadêmico… Embora fosse bom você dormir um pouco mais⁷, indispensável compreender, como princípio basilar, a necessidade de viver plenamente seus anos de empreendimentos mais relevantes – os que correm atualmente. N’outras palavras, melhor seguir a diretriz de viver mais em termos de qualidade do que de quantidade… “acrescentando vida aos anos, e não anos à vida”, como já disse um pensador da modernidade⁸.
(BTA – Perguntei mentalmente a Eugênia se ela já se dava por satisfeita e se poderia interromper o diálogo.)
EA – Sim, estou satisfeita, de minha parte. E você deveria estar também. Energias represadas são sempre destrutivas, e o prezado companheiro já conhece as implicações negativas de deixá-las assim, no interior do corpo e da mente⁹. Sugiro, dessarte, que ponha em prática a busca do equilíbrio, da totalidade, da saúde, como coordenação harmônica do ser, com respeito à sua multidimensionalidade – ou isso, ou jamais se poderá cogitar de saúde integral, de completude, de sentimento de realização pessoal, de plenitude, de bem-aventurança, de felicidade…
(BTA – Eugênia fez uma breve pausa, como a me dar tempo para digerir o que me acabara de dizer, e tornou, ainda mais complexa, à lição, aproveitando meu interesse em continuar nossa conversa psíquica, apesar de me haver sugerido sua pronta suspensão.)
EA – Antes de lhe determinar, peremptoriamente, a mudança de ciclo ocupacional, peço-lhe, um pouco mais suavemente: seja feliz, bem feliz, cada vez mais feliz… E sua felicidade parece carecer de um trato de paixão, um pouco negligenciada ultimamente, não? (risos) Trabalho e severidade demais… Onde está o aspecto lúdico? Onde mora sua criança interior? Onde há espaço para que se manifeste, em sua existência, o divertido “trapaceiro arquetípico”, a rir da própria desgraça?… Logo, faz-se mister a recuperação desse fôlego emocional, porque será pela força psíquica da sombra psicológica que você restaurará a motivação e a inspiração para realizar mais e melhor ¹⁰.
(BTA – Após novo silêncio breve, a adorável Preceptora Espiritual prosseguiu:)
EA – Acredito que o companheiro deva agir pela disposição permanente de servir em Nome de Deus, mas começando pelo cosmo interior, pela gerência da ecologia da própria alma, entendida como todo um sistema de forças discrepantes e múltiplas, alinhadas ou conflitivas, que configuram uma espécie de entidade coletiva, ou um indivíduo composto de feixes ou núcleos inúmeros de psiquismo, quais órgãos a formar um grande e complexo organismo mental. Assim, notando o turbilhão íntimo surgir, deve suspender a atividade a que se dedica agora e partir para a elaboração dos conteúdos internos, a fim de que, recobrada a harmonia dos elementos constitutivos de si mesmo, possa retornar ao trabalho de ânimo renovado e resoluto.
BTA – Obrigado, mamãe Eugênia¹¹.
Eugênia-Aspásia (Espírito)
Benjamin Teixeira de Aguiar (médium)
Aracaju, 15 de janeiro de 2008
1. A cada cinco ou dez segundos, Eugênia me parecia mudar de ambiente. A princípio, apresentou-se-me no interior de um apartamento-terraço, em espigão de uma cidade do domínio extrafísico; depois, entre colunas gregas, num templo de Atenas; em seguida, num jardim em frente do templo, caminhando por uma vereda entre as flores e, logo após, assentando-se na balaustrada de um chafariz ao centro daquele cenário; noutro momento, servia-me uma chávena de chá numa cabana, no meio de uma floresta; por fim, andava ao meu lado, à beira da praia. E, às vezes, parecia estar em todos os lugares ao mesmo tempo. Fiquei um pouco confuso, porque, normalmente, ela até muda de ambientes, mas antes costuma passar alguns dias, e eventualmente semanas inteiras, mostrando-se num único lugar. Nunca ela modificara tanto a ambientação para aparecer à minha visão psíquica. Quando lhe reportei a questão, a Orientadora Espiritual, assumindo a faceta da mestra bem-humorada, brincando com o discípulo, fez as cenas se substituírem, como num rodízio psicodélico, em fração de segundo (o suficiente apenas para eu reconhecer o local), acabando por concluir a conversação envolta na psicosfera de “Atenas Mística”, d’onde habitualmente ela fala comigo.
2. Quando estou muito cansado ou demasiado triste, é comum que chame Eugênia de “mamãe”, na intimidade. Nesta madrugada, era o extremo cansaço que me assoberbava.
3. Utilizei a terminologia clássica espírita – ubiquidade –, para aludir ao fenômeno da “irradiação” de seres espirituais a mais de uma localidade ao mesmo tempo, o que só é possível a entidades extremamente avançadas no carreiro evolucional. Eugênia, por sua vez, respondeu valendo-se de conceitos da física quântica, em verdade bem mais apropriados a esclarecer o complicadíssimo processo.
4. “Carta a Meneceu”, opúsculo do filósofo grego Epicuro (342/341 a 271/270 a.C.), que Eugênia me recomendou lesse e estudasse, madrugada adentro.
5. Eugênia faz referência a um traço, de fato, muito peculiar à minha personalidade, desde a infância: de não me submeter a convenções sociais, a tradições (ainda que espirituais) ou a preconceitos, de quaisquer ordens.
6. No sentido que a matemática do caos dá à desordem: como uma ordem implicada em nível mais alto de complexidade.
7. Lamentava-me com Eugênia, por ter voltado a dormir pouco na última semana, novamente em virtude de sobrecargas do trabalho. Interessante divisar a intrincada orientação de autênticos guias espirituais, prenhe de paradoxos, por transcender em muito um parâmetro linear-racional comum de pensamento e avaliação. A Mentora Espiritual tanto freia o processo que, por minha natural propensão, me leva a reduzir exacerbadamente os períodos de sono, quanto me incentiva a efetivamente prolongar a vigília, quando a situação o exige. A propósito, indico aos(às) nossos(as) internautas a leitura da curiosa mensagem “Golpe alto”, publicada em 27 de dezembro de 2007.
8. Dr. Edward J. Stieglitz (1899-1958), provável autor da máxima.
9. Ao suspender a psicografia, Eugênia estimulava-me a fazer uma experiência de meditação que supunha necessária, não obstante o adiantado da hora, com o dia já amanhecendo.
10. Na didática e psicologia primorosas do Espírito Eugênia, tal proposição corresponde à fala mais veemente dos mentores espirituais à moda antiga: “Levante-se, preguiçoso-reclamão; vamos trabalhar mais.” Não atravesso propriamente uma crise existencial; tenho, apenas, momentos de esgotamento profundo, em função do enorme volume de afazeres e, sobremaneira, de responsabilidades. Representantes da Espiritualidade Maior costumam fazer pouco caso de nossa exaustão, propondo-nos não só o retorno ao trabalho, mas a realização do serviço com fervor, dinamismo, alegria e gratidão – jamais como se fosse um sacrifício ou um castigo… É essa justamente a “sutileza” que distingue o trabalhador compulsivo – o “workaholic” – do realizador excepcionalmente ativo. Já amanhecia… eu estava em atividade há pelo menos 18 horas ininterruptas… e a Mestra Espiritual me sugeria sorrir, com entusiasmo, para continuar nas tarefas complicadas… Já pensou??! (risos) E o povo ainda sente inveja de médiuns em mediunato – os que temos compromisso com a coletividade!… (risos)
11. Pois é… a gente ainda tem que agradecer, bem amorosinho!… (risos)