Benjamin Teixeira
pelo espírito Eugênia.
Eugênia, deseja provocar algum assunto em particular?
Sim. As experiências de quase-morte.
Que ótimo, Eugênia. Esse assunto é fascinante, e não vejo vocês falarem muito sobre isso, nem na literatura espírita clássica.
Exatamente. É mais ou menos desse assunto, dessa linha de raciocínio que gostaria de expender minhas opiniões.
As Experiências de Quase-Morte vieram renovar as expectativas, conceitos e esperanças da humanidade a respeito do além-morte. Nem o niilismo filosófico das linhas orientais de pensamento espiritual, nem a visão infantil e mitológica de um paraíso idílico contraposto a um inferno monstruoso da ótica ocidental clássica-cristã. Devemos ter uma visão mais realista e, concomitantemente mais otimista do além-túmulo.
Sem dúvida. É isso que noto. Apesar de a esmagadora maioria daqueles que passam por EQM’s não serem ases de espiritualidade e amor ao próximo, tiveram experiências bem positivas além-túmulo, contraditando o padrão dos relatos mediúnicos da literatura espírita clássica, que apresenta um pós-mortem bem mais amargo.
Muito bem. É aí onde mora a questão mais importante a tratarmos aqui. Existem preconceitos calcificados no meio espírita, impregnados na literatura mediúnica inclusive, que devem ser desfeitos. Não existem experiências tão dantescas no pós-morte, na medida generalizada como indica tal literatura. Ou seja: existem regiões infernais. Mas a atual literatura espírita dá a entender que mesmo pessoas de relativa evolução e dedicação ao bem sofrerão maus bocados no transpasse para a outra dimensão, por não terem feito mais e melhor. Não é bem assim que se dá. A Divina Providência é sábia e não exigiria de grelos frágeis frutos maduros. Cada um é avaliado conforme o grau de consciência atingido.
Então, há erros na literatura espírita…
Como em toda literatura, inclusive a científica. Trata-se de uma necessidade revisionista que propomos, sem invalidar a mensagem geral dos grandes missionários do passado que constituíram obras luminíferas de amor e sabedoria. O próprio Kardec previu isso: a mudança de postulados e perspectivas “doutrinárias”, à medida que o conhecimento humano avançasse. Deve-se perder a ilusão de que informações mediúnicas têm caráter de verdade. Como toda obra humana, está impregnada da cor mental, dos preconceitos e presunções de verdade de uma época e cultura específicos. Os próprios mentores de Kardec, em “O Livro dos Médiuns”, previram que os guias espirituais contornam assuntos polêmicos, respeitando as premissas de verdade e portanto, as pré-concepções de seus médiuns, para não criar-lhes conflitos extemporâneos e inadequados. As informações do Plano Maior acompanham um programa gradativo de revelação, que des-cobre camadas sucessivas de verdade, para não ofuscar olhos frágeis com uma dose excessiva de luz. No particular das expectativas para o pós-mortem, porém, chegou o momento de reavaliarmos a literatura espírita, já que não condiz mais com o padrão médio geral de valores da população terrícola aguardar julgamentos draconianos, ao molde da ética e da moral de tempos idos. Muita gente, inclusive, afasta-se, não sem razão, da temática espírita, por sentir um “cheiro mental” de idéias retrógradas, no moralismo excessivo de certos posicionamentos e de um quase-culto à dor que tresanda da literatura clássica espírita. Assim, seria não só de bom alvitre como gritantemente necessário a reviasão desses conceitos, mesmo porque, de fato, como os estudos de taunatologia indicam, não existe tanto horror no além-morte física, como se supunha até então. Muito pelo contrário: o Amor Divino a todos envolve, com perdão e bondade, embora não isentando ninguém de responsabilidade por seus atos, assim fazendo com que esses indivíduos voltem transformados de tais experiências, em vez de aterrorizados com a perspectiva de punições acerbas no além-túmulo.
Muita gente contraditará tal visão, por respeito à honorabilidade dos grandes missionários do passado.
Não estamos questionando a importância das obras do pretérito, muito menos a honorabilidade daqueles que deram sua vida pelo ideal espírita. Apenas, por uma questão de lógica histórica e principalmente científica, não podemos parar no tempo e recitar antigos conceitos obsoletos, apenas por honrar seus formuladores de outro tempo. Ninguém, por exemplo, estará destronando Einstein de seu mérito inegável como cientista, por ser proponente da Física Quântica, e nenhum médico de hoje seguirá a cartilha de Galeno na hora de receitar remédios a seus pacientes, em homenagem ao grande sábio da saúde no passado.
Com relação, por exemplo, aos relatórios colhidos pelos pesquisadores de EQM’s, no que diz respeito a testemunhos e experiências de milhões de indivíduos, trata-se de uma massa, portanto, inegavelmente grande de dados, para que possa ser considerada apenas uma opinião. Trata-se de um fato, de estatística, de confronto inter e multi-cultural de dados, que dá um caráter de verdade praticamente indiscutível a esses estudos. Por mais respeitável um ou alguns grandes médiuns do passado, nenhuma fonte isolada pode ser considerada mais segura que o confronto de dados de milhares de pacientes de “morte clínica”, em países, culturas e épocas distantes, todos relatando a mesma ordem de vivências e ocorrências além-morte. Detalhe importante: essa seqüência de vivências, de uma forma geral, confirma o que a literatura clássica espírita vinha afirmando desde os seus primórdios, a respeito da aduana da outra dimensão: recepção por parte de parentes já desencarnados, o processo de desligamento do corpo físico amiúde acompanhado pelo paciente. Mas o importante considerar é o contato quase generalizado com seres amorosos, e com o Ser de Luz, interpretado, por muitos, como a Própria Presença Divina, que surge para quase todos que avançaram muito nas EQM’s, o que, na literatura clássica, é reservado apenas para os grandes luminares do espírito.
Vivemos a era da compreensão e da aceitação da Infinita Bondade de Deus. A forma implacável como a morte é mostrada na literatura clássica espírita, com julgamentos severos e punições amargas para quase-todos (o inverso do que demonstrado nas EQM’s), constitui um resíduo das visões medievais de além-túmulo que propalava o terror e a culpa, como meio de frear maus comportamentos na humanidade e regenerá-la. Hoje, com os novos prismas da psicologia e da pedagogia, sabe-se que tal metodologia é contra-producente, além de não corresponder à Realidade Divina.
Nossa! Isso é revolucionário e contraverso.
Irreversível, prefiro dizer. O que digo não é tão revolucionário, quanto parece em primeiro exame, porque está em perfeito acordo com o novo padrão de consciência médio da Terra, que não admite mais a ótica infantil e medieval de medo de punições eventuais além-túmulo. Controverso apenas para a “turma do contra”, reacionária, que aparece e faz barulho, ante qualquer perspectiva de mudança. Mas seus componentes farão um barulho inglório, caso pretendam se insurgir contra o progresso, pois que o bonde da história não se apieda de reacionários, mesmo porque estarão contra a Vontade Divina, que não quer atemorizar Suas criaturas e sim conscientizá-las. Estarão lutando, assim, contra todas as forças: da Terra e do Céu, fadados, portanto, a retumbante fracasso, seja mais cedo, tanto maior se mais tarde.
(Diálogo travado em 21 de fevereiro de 2004.)