Benjamin Teixeira
pelo espírito Eugênia.
Eugênia, 200 anos de renascimento de Kardec, no plano físico. Teria algo a nos dizer sobre isso, além de sua linda “Oblação a Kardec” (*1)?
Sim, que cada um deve fazer sua parte, no drama da expansão das idéias espíritas sobre a Terra. Somos partidária da tese de que o Espiritismo será disseminado não propriamente pelo aumento do número de seus prosélitos, mas sim, pela expansão e aprofundamento das idéias kardequianas e espíritas no seio da mente popular. Não se trata de uma cruzada de “conversão dos infiéis”, à moda clássica de todas as guerras santas, de todos os tempos e culturas. A modernidade tem mostrado, com os horrores do terrorismo, aonde pode levar o fanatismo religioso. O Espiritismo constitui uma das veias fundamentais de evolução do pensamento humano na Terra, conjugando ciência e religião, razão e fé, numa filosofia de vida pragmática, bem à feição de mente coletiva de hoje. Hollywood já atesta isso, com os filmes de temática espírita, alguns deles com acerto impressionante, na retratação fidedigna de fatos espirituais (*2).
Há alguma relação, então, entre a obra de Kardec e o movimento de Nova Era, nos Estados Unidos, que parecem ter raízes completamente distintas?
Há, e muita. Se fizermos uma rápida reportação história, recordar-nos-emos de que as idéias de Kardec rapidamente atravessaram o Mar da Mancha e, depois de profundamente enfronhado na sociedade inglesa, chegou aos Estados Unidos, na região conhecida por Nova Inglaterra (*3). Como, todavia, a resistência cultural foi grande, naquela tradicionalista comunidade puritana, muito semelhante à britânica, naturalmente migrou para a terra dos pioneiros, o oeste norte-americano, onde, na Califórnia, hoje se situa, mais estabelecido, o movimento Nova Era. Obviamente que, após tantas migrações, e no transcurso das décadas, seu desencadeador original se perdeu, consociado à forte natureza etno-cêntrica, anglo-cêntrica dos povos anglo-fônicos, que não costumam aceitar contribuições diretas de indivíduos componentes de outras culturas.
Mas e quanto aos fenômenos de Hydersville (*4)?
Foram desencadeadores do corpo de reflexões de Kardec, que logo propiciaram a participação de gente culta, com um lastro filosófico para o fenômeno, como foi o caso, inclusive, de seu movimento gêmeo, em terras norte-americanas, a Teosofia, criada em 1888, com a obra “A Doutrina Secreta”, da médium russa Helena Petrovna Blavatsky, que se cercou de gente culta da elite ianque, em Nova York, quando para lá emigrou, na década de 1870 (*5). Sem isso, tais fenômenos morreriam como curiosidades momentâneas. Só se desenvolveram como um movimento, justamente porque havia livros e estudos sérios a respeito.
Muitos perguntam, com um certo tom irônico, por que o Espiritismo, como o conhecemos, sumiu praticamente no mundo inteiro, existindo como movimento pontual, e só no Brasil afigura-se como um fenômeno, até certa medida, de massas. Que nos diria sobre isso?
Que se deve pensar que todo movimento tem períodos de expansão e retração, e que espirais dialéticas indicam movimentos mais profundos e mais sólidos, por absorverem vertentes histórias, para prosseguirem mais fortalecidos adiante. No caso em particular do Espiritismo, sofreu ele uma retração estratégica, do mundo para o Brasil, a fim de assimilar, em profundidade, a sua veia religiosa, hoje alicerce inconteste de suas estruturas ideológicas, para que, então, possa retornar ao restante do mundo, amadurecido como uma tradição espiritual de forte lastro racional (não mais como uma curiosidade de gabinete), assim podendo enfrentar, vitoriosamente, os sofismas e as gargalhadas dos incrédulos e dos escarnecedores de coisas sérias. Não por acaso, foi justamente a falta de sentimento religioso que fez o Espiritismo fenecer nas nações européias e no Nordeste ianque, fazendo prosperar as versões cientificistas de explicação do fenômeno mediúnico, como a Metapsíquica (1885) e a Parapsicologia (1928).
Algo mais a declarar sobre essa fascinante temática?
Não, satisfeita. Que aguardemos o desdobramento da História. O que era o Cristianismo, no seu segundo século de existência (*6)? Nada mais que uma seita apócrifa de escravos e párias da sociedade romana. O que é o Cristianismo atualmente? A religião dos povos dominantes da Terra. Quem observa com desdém o Espiritismo de hoje ri como o fizeram os Césares de Roma Antiga, que já viraram pó e notas de roda-pé de livros encardidos pelo tempo, há muitos séculos…
(Diálogo travado em 3 de outubro de 2004.)
(*1) Mensagem que foi ao ar no dia exato da comemoração de aniversário de Kardec.
(*2) A exemplo de “The Others” (“Os Outros”).
(*3) “New England” – grupo de estados super-prósperos e altamente tradicionais da história norte-americana, situados no Nordeste de seu território, e que inclui Nova York.
(*4) O famoso caso das “irmãs Fox”, de 1848, considerado, por muitos autores, o ponto de partida do grande movimento de fenômenos de efeitos físicos que, por diversos anos, alastrou-se por Europa e Estados Unidos, nos salões mais “chiques”, o denominado, à época, “fenômeno das mesas girantes”.
(*5) 1873.
(*6) O Espiritismo tem hoje exatos 147 anos de existência, contados a partir da publicação do livro-alicerce da codificação kardequiana, “O Livro dos Espíritos”, em 18 de abril de 1957.
(Notas do Médium)
Em comemoração ao bicentenário de nascimento de Kardec, esta mensagem e a do domingo, ontem, dia 3, foram sobre ele desenvolvidas. Além delas, está disponível também a mensagem do dia 2, particularmente interessante, que você pode acessar clicando em “mensagens anteriores”, no canto superior esquerdo de seu monitor.