Não misturemos fé com ficção; realidade psicológica com fantasia egoica; Desígnios de Deus com crenças e cultura de certa época e lugar, ou com desejos e expectativas pessoais e acomodatícios para o porvir.
Não obstante o universo imaginário carregue, em seu bojo, conteúdos importantes provenientes do inconsciente – a serem decodificados, em prol de um grau maior de autoconhecimento –, jamais deve ser ele confundido com o Domínio Transcendental de Realidade em que consiste o Mundo Espiritual.
Jesus, o maior Representante da Voz da Verdade sobre o planeta, de todos os tempos passados e futuros, foi de uma contundência amiúde atordoante, a par de sua infinita amorosidade, sem que haja nisso qualquer contradição, apesar da enorme tensão dos contrários, que, no caso de Nosso Senhor e Seu Discurso, constituiu uma viva e dolorosíssima Cruz no Espírito!…
Chamava a Si as criancinhas, asseverando que só adentrariam o Reino de Deus aqueles que a elas se assemelhassem; e, com a mesma veemência, acusava autoridades religiosas e políticas de hipócritas e “sepulcros caiados”, chegando a pungentemente declarar aos que O ouviam e interpelavam: “Ó, geração incrédula e perversa!… Até quando estarei convosco? Até quando vos hei de aturar?…”
Curava enfermos do corpo e da alma, prenhe de profunda compaixão, e tomou de um chicote, revirando as bancas do Templo de Salomão, em altos brados de repreensão Celeste, frente aos vendilhões simoníacos, de todas as ordens de venda das “coisas sagradas”, a começar das hipócritas conveniências sociais e da busca de prestígio pessoal, acima dos reclamos da própria consciência!…
Defendia párias morais da sociedade, como meretrizes e publicanos, a ponto de afirmar que eles entrariam no Reino dos Céus antes de religiosos de Seu tempo, mas jamais compactuou com os interesses do momento, nem mesmo de Seu grupo mais íntimo de discípulos, a exemplo da árdua advertência ao apóstolo Pedro, justamente quando este se preocupara com os vaticínios sobre a crucificação do Mestre, nos impressionantes termos: “Cala-te, Satanás!…”
Os Evangelhos de Nosso Mestre e Senhor Jesus oferecem um caleidoscópio de possibilidades moralmente apropriadas de ação efetiva e resolutiva, para qualquer época ou circunstância consideradas, com vistas à a autorrealização e felicidade humanas.
O Cristo-Verbo aludiu, com ênfase, à alegoria do Reino de Deus como uma semente. Associada a ela, existe a metáfora da charrua ou do arado, que consideramos complementar àqueloutra que já utilizamos noutras oportunidades: a do bisturi.
O Arado da Voz do Céu faz rasgar o seio da terra de nossos corações e mentes, favorecendo a semeadura, a irrigação e a adubação das bolotas de árvores frutíferas de ideias, valores e realizações que possam ser desdobrados em nossa interioridade, a serviço do nosso e do bem de muitas outras criaturas. Em contrapartida, o bisturi em que se pode configurar a Voz da Verdade relativa (a que nos seja assimilável, de conformidade com o grau evolutivo de cada qual), em ferindo os tecidos de nossa psique, eventualmente extrai de lá tumores, potencial e tremendamente lesivos a nós próprios e a terceiros que estejam dentro de nosso raio de influência pessoal.
Para encerrar este breve ensaio, recordemo-nos da assertiva crística sobre as inarredáveis perseguições sofridas pelos autênticos buscadores da Luz. São justamente elas que trazem a sinalização positiva de que estamos no Caminho do Céu. E ampliemos o conceito de “perseguições”, para além das incompreensões e ataques gratuitos do mundo externo, alcançando também os conflitos inevitáveis do cosmo interior. Se o ego e as subpersonalidades mais primitivas ou destrutivas que compõem nossa totalidade mental, qual a sombra psicológica (na acepção mais restrita de elementos negativos de si), a criança interior (igualmente em seus traços negativos) ou a sizígia (1), não se incomodam ou não impõem resistência a certa tarefa encetada no Bem, tal iniciativa não estará vinculada ou alinhada ao Plano Sublime de Vida, que necessariamente nos fomenta os aspectos mais nobres do ser e os processos evolucionais da consciência, expandindo-nos as percepções e a capacidade de sentimento, intuição, razão e a própria espiritualidade.
Espírito Eugênia-Aspásia
Médium: Benjamin Teixeira de Aguiar
New Fairfield, Connecticut, EUA
29 de novembro de 2016
(1) Ou arquétipo da alteridade (segundo Carl Gustav Jung), que se refere aos opostos masculino-feminino na psique humana.