Benjamin Teixeira
pelo espírito Gustavo Henrique.
Estamos no ano de 1933. Aracaju é uma cidade pequena e provinciana. A quase metrópole dos dias atuais, que beira o contingente demográfico de 800.000 habitantes, não chegava sequer aos 80.000, por aqueles dias. Pouquíssimos automóveis. Alguns raros endinheirados que se graduavam em curso superior, em outros estados, liam jornais do Sul e, pouco adiante, ouviam rádio, a Nacional, do Rio de Janeiro. No mais, pobreza e miséria generalizadas, como quase todas as capitais nordestinas do Brasil daqueles dias longínquos. Uma pequena elite intelectual, se é que assim podemos dizer, alguns poucos profissionais alfabetizados, compunham a classe média de funcionários públicos e artesãos, profissionais liberais e pequenos comerciantes, formando a faixa que se poderia dizer pensante do Estado de Sergipe Del Rey.
Um jovem está severamente triste. Mora naquela cidade, desde que nasceu, mas está psiquicamente esgotado. Chamaram-no para conhecer D. Laura Amazonas, a grande espírita de terras aracajuanas. Achava tudo aquilo de contato com o “outro mundo” uma tolice. Andava muito deprimido e diziam que seria resultado de um processo obsessivo grave. Dona Laura Amazonas saberia como resolver. Mulher culta e desapegada, vivia para os pobres e para os ideais da Doutrina Espírita.
O rapaz portava mandato mediúnico importante. Seria uma das pedras fundamentais da disseminação do Espiritismo em terras de Sergipe – aquele estado que havia sido berço de Bittencourt Sampaio, Martins Peralva, e que, poucos anos mais tarde, em 1947, introduziria Divaldo Franco na oratória espírita. E, com o trabalho conjugado de muitos, no final daquele século, um estofo bem preparado de divulgação espírita deveria estar pronto, porque importante projeto de expansão do Espiritismo, feito pela televisão para todo o Brasil, aconteceria a partir da bela e pacata capital sergipana.
João estava particularmente deprimido naquela tarde de domingo. O sino da catedral, na praça Olímpio Campos, tocava, plangente, numa dor que lhe parecia infinita. Não haveria mais motivo para viver. Por que suportar tudo aquilo?
João nascera para construir importante instituição de desenvolvimento espírita. Esse grupo daria suporte fundamental a um programa de rádio que apresentaria, e que vararia décadas, entre os anos 60 e 80 do século 20, quando estivesse entre a meia e a terceira idade. Milhares de pessoas seriam tocadas, anos a fio, por seu trabalho libertador, e Aracaju tornar-se-ia, antes mesmo do fim do século, um dos maiores centros do Espiritismo em todo o território nacional, considerando-se percentuais de adeptos. O planejamento existencial havia sido traçado, criteriosamente, por elevados mentores do Plano extra-físico de vida, antes de seu reencarne. Mas João, aturdido por entidades perversas domiciliadas na dimensão incorpórea de vida, estava muito longe de iniciar sua tarefa. Muito pelo contrário. Embora inúmeras vezes incitado por seus protetores espirituais, por mil modos, diretos e indiretos, a iniciar a redentora tarefa mediúnica, que o capacitaria para a realização de toda sua missão de amor e esclarecimento, João mantinha-se resistente, fixando-se em vícios emocionais de outras existências, desperdiçando o valioso ensejo de libertação e paz.
Sentia-se inútil, incapaz. E, muito embora às vezes ouvisse com clareza vozes que ninguém mais dizia escutar. Muito embora divisasse, com a visão do espírito, silhuetas muito bem definidas de amigos ou de agressores e sofredores de outras faixas de existência, permanecia atado ao conceito de estar perdendo o juízo, como lhe dissera, com ares graves, o médico da família que o atendeu, prescrevendo-lhe repouso e banhos medicinais.
O fato é que naquele domingo João cometeria suicídio, quando tudo estava para começar. O centro espírita estava programado surgir em 1935, aproximadamente. Por aqueles dias, João, um moço que estaria mal passado dos vinte anos, começaria a trabalhar como médium vidente e audiente, para depois prescrever receitas mediúnicas e, por fim, no final dos anos 50, estabelecer os primeiros contatos com a Rádio Difusora de Sergipe, a fim de iniciar as atividades radiofônicas em torno de 1960. Seu desencarne só ocorreria por volta de 1995, quando João já teria ultrapassado a barreira dos 80 anos. Mas… tudo foi por água abaixo. Os centenas de milhares de pessoas que diretamente teriam sido auxiliadas por seu trabalho e os milhões de habitantes de Estado de Sergipe, no correr de trinta anos, sem contar toda a base montada para o trabalho de divulgação espírita nacional, que estaria começando justamente no período em que ele estaria encerrando o seu…, tudo, tudo simplesmente havia malogrado com o seu fracasso retumbante pelas portas sinistras do suicídio.
Muitos anos mais tarde, como a obra de Deus não pode deixar de acontecer, de uma forma ou de outra, o casal José e Neide Mesquita realizariam tarefa menor no campo de divulgação radiofônica do espiritismo em Aracaju, bem como até mesmo alguns ensaios, em 1975, de divulgação televisada.
João ainda está desencarnado, hoje já se preparando para uma encarnação de provas. Nascerá em lar muito pobre, sofrerá de série deficiência congênita que o fará paraplégico desde cedo, e ressurgirá para o mundo mais uma vez, na amada cidade que foi o palco de seu decesso, no século transato. Encontrará uma Aracaju com ares de metrópole, quase 1 milhão de habitantes e um espiritismo espetacularmente divulgado, pelos esforços conjugados de diversos tarefeiros reencarnados para esse mister durante todo o século XX, principalmente logo após seu delíquio moral, com o nascimento combinado de três grandes figuras do movimento espírita sergipano da segunda metade do século XX, descidas em uma iniciativa coletiva compensatória à lacuna que seria deixada no ritmo das atividades de dilatação do Espiritismo por aquelas plagas. Assim, o que não aconteceu de um modo, surgiu por outro. A divulgação antecipada pela mídia radiofônica, como uma precursora do que aconteceria pela televisão mais tarde, por outro trabalhador que desceria ao proscênio terrestre para esse fim, não ocorreria, e, assim, o programa de TV teria que surgir sem o estofo do programa de rádio que teria acontecido durante praticamente toda a segunda metade do século XX. Em 1984, todavia (com mais de vinte anos de atraso) uma iniciativa menor aconteceria: um programa de rádio surge, em nome da Federação Espírita Sergipana. Graças a isso, a semente foi plantada do grande projeto de divulgação espírita em Sergipe, que tomaria dimensões nacionais, na virada do século.
A teia da ordem divina se estabelecia, de um maneira ou de outra, e, com ou sem a colaboração deste ou daquele trabalhador isolado, avançava, rumo à grande meta que já estava antevista.
O século XXI inicia… João fracassou, mas não o Espiritismo, que cresceu como nunca. Um ano antes de seu desencarne espetacular, alguém começara missão grandiosa, que daria respaldo a toda a tarefa de crescimento exponencial do Espiritismo no século XXI: um garoto de Pedro Leopoldo, de idade similar à sua, que, com menos recursos de instrução e com menos condições financeiras, lança o “Parnaso de Além Túmulo” que seria a primeira de uma série de mais de 400 livros que publicaria durante sua prolífera existência física. Um garoto que todos se acostumaram a venerar e amar na alcunha carinhosa de Chico Xavier.
Enquanto uns fracassam fragorosamente, outros vencem galhardamente. E, em meio a todo esse drama de ocorrências aparentemente predestinadas, o livre-arbítrio pessoal jaz preservado, inviolável, para que uns se vejam como vítimas, e desertem, horrendamente, de compromissos sagrados assumidos perante Deus, enquanto outros se mostrem heróicos até o fim, persistindo no posto de serviço a eles confiado pelo Divino Senhor.
(Texto recebido em 27 de dezembro de 2002.)
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Nota do Médium.