Benjamin Teixeira pelo espírito Eugênia

A intolerância é uma das maiores chagas a atormentarem a espécie humana, desde suas expressões mais singelas, de ordem opiniática, às mais complexas, envolvendo vetores civilizacionais inteiros, amiúde conduzindo povos ao horror da guerra. Seja ela religiosa, de cunho político, étnico, sexual ou mesmo de natureza filosófica ou científica, tem, todavia, a mesma raiz: a pouca tolerância a respeito das próprias ambigüidades.

A mente humana é polidimensional. Diversos estratos da psique são completamente ignorados pelo indivíduo, de modo que, por existirem, embora de modo subliminar, e exigirem cidadania, se assim podemos dizer, no campo da luz da consciência, refletem-se, distorcidamente, nos mecanismos de projeção psicológica, tão estudados por pesquisadores da mente. O ódio, por exemplo, pelos aspectos feminis de si, como a intuição, a sensibilidade, os pendores artísticos e espirituais, pode ser espelhado em figura feminina externa, como a própria mãe ou a esposa e gerar, por conseqüência, uma repulsa por ela instintiva e, não raro, impetuosa e desmesurada..

A tolerância, portanto, não é uma questão de se converter os outros aos nossos pontos de vista, por mais pacíficos os métodos adotados, porque é exatamente esse o princípio desencadeador da intolerância. Não é ser gentil com o outro e continuar depreciando-o por dentro – isso é hipocrisia, ou, em melhor medida, diplomacia, mas nada tem a ver com tolerância ou muito menos com sentimento cristão ou espiritual.

Ser tolerante não é conviver com o outro apesar das diferenças, mas mesmo por causa delas, por representar a diferença um elemento altamente enriquecedor para a expansão e complexificação da consciência, cobrando-lhe a descoberta de conexões mais profundas e abrangentes entre elementos cognitivos e conceituais a princípio compreendidos como antagônicos e inconciliáveis.

Claro que não postulamos que se deva tolerar o intolerável, qual sejam: os comportamentos destrutivos. Polícia, presídios e exércitos existirão na Terra, por um bom tempo ainda, enquanto houver seres humanos sem condições de usar sua liberdade sem ferir os direitos alheios. Afora, todavia, o que fizer mal às criaturas, tudo deve ser recebido com condescendência. Deve-se lutar contra o pecado e não contra o pecador, como reza a tradição cristã.

Somente mentes imaturas não toleram a diferença. É traço típico de estruturas psíquicas mais amadurecidas e sábias a tolerância a toda forma de ambigüidade ou mesmo conflito, já que aprenderam a tolerar as próprias contradições interiores. Não é o conflito que tem que ser cessado: o conflito é promotor de progresso, propelindo quem lhe padece a encontrar um nível mais alto de consciência, pelo esgotamento do patamar em que se encontra e suas possibilidades de solucionar o dilema descoberto. Se há a eliminação do conflito, pura e simplesmente, sem a assimilação do seu conteúdo de incentivo à evolução, pára-se e perde-se a excelente oportunidade de crescimento que representa.

O proselitismo de toda ordem, toda forma de sectarismo, não só de ordem religiosa, mas em todas as áreas de atuação e conhecimento humanos, constituem um grande escolho ao processo de ascese da espécie, bem como dos indivíduos, a planos mais altos de excelência, felicidade e paz, senão mesmo um sério risco à sobrevivência da humanidade.

Todo povo realmente civilizado e todo indivíduo de fato instruído e maduro toleram, em larga medida. Intolerância é sinal de primitivismo, puerilidade e atraso intelecto-moral.

(Texto recebido em 14 de fevereiro de 2001.)

Nota do Médium:

Um jovem amigo pediu-me para conversar com o Grande Mentor. De fato, esse é hábito que não me apraz atender, mas Anacleto quis entabular a conversa, dizendo querer aproveitá-la para a coletividade, publicando-a, já que o tema era motivo de angústia para expressiva parcela da população.

Por meio da psicografia, conversamos com ele. Transcrevia as indagações do rapaz, e, logo em seguida, o mestre me transmitia sua resposta, que digitava ao computador.

Como sempre, Anacleto, em sua concisão sábia e direta, deu, em poucas palavras, uma fantástica lição de como lidar com as paixões, indicando os pontos principais a saber: suas origens reais e os meios práticos de se lidar com a situação.

Benjamin Teixeira
Aracaju, 16 de fevereiro de 2001.

Estudo sobre a Paixão.

Prezado Anacleto: estou extremamente angustiado, porque me apaixonei por uma jovem, e não sei como me conduzir.

Se sabe se tratar de uma paixão tão-somente e não de amor; se se sente perturbado e não edificado, deve agir do modo como a razão determina que se deva conduzir nessas situações: com ponderação e abstinência.

Não é tão fácil assim.

Oh, é sim. É uma questão de se querer.

E quando não se quer? Parece justamente ser esse o grande drama da paixão: passamos a desejar algo que nos é proibido.

Isso significa que as energias estão sendo direcionadas de modo errado. O estímulo deve ser transmutado para algo útil. Bom recordar-se do que disse Freud, o grande pai da Psicanálise: as maiores conquistas da civilização advieram da sublimação do excedente de energia sexual.

Muito fácil de se dizer. Dificílimo de se aplicar.

Não quando se pensa que o prazer momentâneo, se atendido, será seguido de sofrimentos arrasadores; se a concessão feita ao imediatismo trouxer terríveis marcas duradouras, e se arrastar para fora da rota da felicidade o aventureiro que se lhe lance aos braços.

Em termos práticos, o que sugere que eu faça?

Que se concentre em seus sonhos, em seus grandes projetos de vida, em seus ideais. Normalmente, quando alguém tem espaço para paixões ardentes, está com espaço mental ocioso, potencial criativo inutilizado pedindo o calor da ação. O vazio da não-realização, por esse desperdício-negligência no campo do essencial, projetado, conduz o indivíduo, inconscientemente, a tentar compensá-lo por meio do arrebatamento da paixão. Eis porque, assim, constitui um simples desvio existencial entregar-se à fúria dos instintos e das emoções desgovernadas.

Como vou saber o que devo fazer?

Siga o seu coração, suas mais caras intuições, seus ideais mais elevados, e saberá claramente o que deve ser feito. Confie mais em si mesmo e saiba que veio ao mundo físico em cumprimento de uma delegação divina – ou não estaria aí, já que o Criador não faria qualquer coisa sem um propósito. Nenhum animal tem vacilações quanto a seu caminho. Você também pode saber. Ouvindo a voz da consciência, saberá exatamente do que se trata sua estada na Terra. A paz, a sensação de dever cumprido, de estar no caminho da verdade farão o coroamento dessa descoberta. Siga-a, e será feliz.

Anacleto.

(Recebido em 16 de fevereiro de 2001.)