O Natal se aproxima. Como noutras ocasiões, Jesus-menino vem a nós, para saber se já estamos preparados(as) a recebê-l’O, no íntimo de nossos corações. Ele não espera encontrar palácios de virtude ou riquezas faustosas de grandes obras, mas uma manjedoura singela de boa vontade e a palha seca da disposição genuína de servir, ainda que parcamente.
 
Em todos os tempos e ainda agora, muitos(as) sofrem a ilusão de supor que, para acolherem o Cristo em suas vidas, imprescindíveis são o esplendor e a glória de um espírito redimido. Almas de escol, porém, já se uniram definitivamente ao Cristo de Deus e prosseguem em ágape infinito de ressurreição eterna. Para esses(as) santos(as) e anjos, não mais na Terra, o nascimento de Jesus se deu há muitos séculos, quando ainda se mostravam primitivos(as) como a maioria esmagadora dos(as) atuais habitantes da crosta terrestre.
 
Quem precisa do nascimento de Jesus no próprio cosmo interior são os seres pouco desenvolvidos, e não os iluminados. Eis por que, na civilização terrena, o Natal tem aspectos bastante festivos e repercute muito mais que a Páscoa, que, para quase todos(as), sintomaticamente, lembra mais a dor e o martírio do Cristo do que Sua libertação definitiva do cativeiro da matéria.
 
É que, nos primeiros estágios da evolução humana, a coroa da glória derradeira nos soa tão improvável, distante e inalcançável, que seu significado verdadeiro passa despercebido, distorcido no culto da “Paixão de Cristo”, tão mórbida quão afastada do autêntico espírito cristão.
 
Uma outra desvirtuação grave acontece também no Natal. Como campanha de uma marca mundialmente famosa, surgiu o culto pagão do Papai Noel. Trata-se de uma figura terna, sim; adorável, sim, mas perigosa em suas reais expressões, nos efeitos nocivos que gera no populacho susceptível a hipnoses coletivas: a distração e o desvio da atenção das massas, do essencial para o fantasioso.
 
E, assim, como um lobo em pele de cordeiro, o mito do Papai Noel, com seu ar sedutor de velhinho bom, cheio de presentes a oferecer gratuitamente, toma o lugar do Aniversariante divino. O espiritual, dessarte, é permutado pelo material, e o espírito de reflexão salutar é perdido, em meio à febre consumista.
 
Sem dúvida que a troca de presentes tem seu lado bom, tanto quanto os festejos, favorecendo a psicosfera de reconciliação e confraternização gerais, no período natalino. Todavia, somos de convir que o Papai Noel não passa de uma versão melhorada de Mamom¹, o mesmo que aparece como o gordo “Rei Momo” do Carnaval, só que ainda mais carregado de símbolos de extravagância e apego às posses materiais – vide o luxuoso traje de veludo vermelho e a profusão de ricos e faiscantes presentes, em completo contraste com a simplicidade e o despojamento do Menino-deus no estábulo.
 
De um lado, uma criança pobre, mas cercada do calor familiar e de amigos(as), incluindo animaizinhos da estrebaria, com o forte significado alegórico de que a face primitiva e a humana da alma curvam-se ante o numinoso nascente. De outro, um velho risonho e abastado, mas sozinho, sem família e sem raízes, distribuindo presentes sem dizer o porquê de sua generosidade, nem muito menos o preço que cobrará, mais tarde, aos(às) que se deixam seduzir por seu canto de sereia(tritão).
 
A discrepante diferença entre Jesus-menino e Papai Noel, diametralmente opostos um ao outro, bem serve de metáfora para os perigos de reverenciarmos, em substituição a Deus, o poder das posses materiais, como escolhas de destino com consequências inexoráveis e imprevisíveis.
 
Jesus-bebê não gargalha, como o bonachão barbudo com suas tentações materiais e óbvios favores imediatos, mas emite vagidos inaudíveis, qual frágil recém-nato dentro de nossos corações, representando-nos os débeis propósitos de melhoria e crescimento, realização no bem e felicidade, espiritualidade e paz.
 
Que nos concentremos no motivo central da celebração de Natal. Reunamo-nos em família, considerando não só os(as) componentes de nossa parentela corporal, mas igualmente os(as) integrantes de nossa irmandade espiritual, quantos(as) se afinem com nossos ideais e valores mais subidos. Oremos e reflitamos, juntos(as), em torno de nossos propósitos e iniciativas de fraternidade, amor e harmonia, partilhando afetuosamente com os(as) demais convivas nossos sinceros votos de aplicação efetiva do que dividimos no plano do espírito.
 
Busquemos nos alinhar com a presença do Cristo Cósmico, acessível a todos(as) que de fato se empenhem nesse intento, sejam bons(boas) ou maus(más), virtuosos(as) ou pecadores(as), nobres ou vacilantes. Compreendamos que Jesus-menino desceu à ribalta terrena justamente para aqueles(as) que só podem receber em seus corações uma criança de espiritualidade e não um adulto de maturidade moral, que não suportariam viver.
 
Jesus nasceu para todas as pessoas, mas principalmente para as mais carentes, frágeis e condenadas, exatamente para que todos(as) se habilitem, um dia, ao voo espetacular da espiritualidade sublime, na ressurreição de vida eterna em um futuro distante que, inevitavelmente, nos bafejará os espíritos imortais…
 
Benjamin Teixeira de Aguiar (médium)
Eugênia-Aspásia (Espírito)
23 de dezembro de 2002
 
1. Mateus 6:24.